Por Luiz
Alfredo Salomão
- Introdução
Demografia
e Ocupação do Território
O
processo de colonização do Brasil por um país europeu pouco
populoso, que praticava um mercantilismo baseado na exploração
primária de recursos naturais para exportação, dependente de mão
de obra escrava, e cuja metrópole doava terras através das
sesmarias1
e, por isso, era incapaz de exercer controle sobre uma elite local
violenta, socialmente excludente não apenas dos africanos
importados, mas também dos brasileiros pobres aqui nascidos, deixa
marcas até hoje na ocupação do nosso território.
Após
50 anos do “descobrimento”, ainda não havia portugueses vivendo
aqui. Durante os 350 anos seguintes, a ocupação seguiu o modelo da
colônia de exploração, ou seja, era basicamente litorânea,
dispersa e itinerante de acordo com as necessidades das atividades
econômicas, não havendo vias de comunicação e de transporte
terrestre.
As
feitorias na costa, inicialmente criadas para o controle do
extrativismo e a exportação de seus produtos, como em África,
foram complementadas por assentamentos humanos instalados para
viabilizar a produção do açúcar, da pecuária extensiva,
mineração de metais preciosos, etc. até o final do século XVIII.
Outros aglomerados urbanos foram criados por razões de defesa
(fortificações) e da necessidade de gestão de um vasto território.
No
entanto, alguns autores (NATAL-2014) mostram que não faz sentido
examinar a questão das cidades no Brasil antes de 1870, quando tem
início o processo de industrialização consistente, no bojo da
expansão da moderna cafeicultura exportadora paulista, quando são
deflagrados também os processos sociais e políticos característicos
da chamada Modernização Conservadora do País (1870-1979).
Dentre
esses processos deste período pouco mais que centenário, avulta a
acelerada urbanização, sem qualquer planejamento estatal e
impulsionada por diferentes fatores, com destaque para: a retenção
das terras como reserva de valor, sob a forma de latifúndios
improdutivos, onde vigiam más condições de trabalho e
baixa/nenhuma remuneração dos trabalhadores rurais, conjugadas com
a dificuldade deles de ter acesso à propriedade da terra e sua busca
por melhores padrões de vida, que só a cidade oferecia (escola,
saúde, emprego, proteção social etc.)
Hoje,
o Brasil é um país superurbanizado (cerca de 85% da população
atual vive em cidades) e, de acordo com o Programa das Nações
Unidas para os Assentamentos Humanos, a taxa de urbanização deverá
atingir 90%, até 2020 (HABITAT-2012).
Quem
examina os Censos do IBGE fica impressionado com a verdadeira
revolução demográfica verificada no período 1940-1980, que
arrefeceu um pouco nas décadas seguintes, sem que, no entanto,
cessassem as migrações campo-cidade, que se medem aos milhões por
década.
Em
1940, a população rural era de 28,4 milhões de habitantes (68,8%
da população total), contra apenas 12,8 milhões de pessoas vivendo
nas cidades (31,2%). Proporção aproximada de 2:1 de população
rural para urbana. Já no Censo de 1970, verifica-se que a população
urbana ultrapassou a rural (taxa de urbanização de 55%) e foi na
contagem da população de 1980 que as proporções se inverteram em
relação a 1940. Ou seja, no começo dos anos 80 apenas 1/3 dos
brasileiros ainda viviam no campo, enquanto 2/3 estavam nas cidades.
O
crescimento explosivo das cidades brasileiras2
nas quatro décadas de 1940-80, foi em grande parte induzido, também,
pelo acelerado processo de industrialização, no qual predominavam
indústrias intensivas no uso de mão de obra, constituindo assim
fator de atração das migrações para os grandes centros fabris. A
crise fiscal e a crise da dívida externa, deflagradas no início dos
anos 1980, porém, estancaram a industrialização. Mas novos fatores
surgiram para impulsionar o crescimento das cidades, especialmente as
médias e pequenas.
Um
deles foi a extraordinária expansão da fronteira agrícola para o
Norte, o Centro Oeste e o Nordeste, acompanhada da introdução de
inúmeras inovações tecnológicas na agropecuária brasileira, a
partir dos anos 1970/80, capazes de desenvolver e difundir uma nova
agricultura
tropical3
em substituição às práticas da agricultura temperada da Europa,
utilizadas desde o Brasil-colônia. Tal expansão teve dois efeitos
importantes para o crescimento das cidades: aumentou
consideravelmente a produtividade agrícola e liberou, através da
mecanização extensiva, grandes contingentes de mão de obra para as
atividades de serviços no meio urbano, que cresceram intensamente.
Ou
seja, a agropecuária brasileira viabilizou as ininterruptas
migrações campo-cidade, baixando o custo de reprodução da mão de
obra (custo da alimentação na cidade) e permitindo que menos gente
produzisse mais. De outra parte, a expansão da fronteira agrícola
levou à conversão de muitos distritos municipais, que eram rurais,
em novas cidades.
O
número de municípios brasileiros saltou de 3.952, em 1970, para
5.507, em 2000, ou seja, um aumento de 39%. Porém, se consideradas
as regiões Norte e Centro-Oeste, onde se deu a maior dinâmica de
expansão agrícola, os números são ainda mais surpreendentes: de
195 para 449 municípios, na região Norte (+130%) e de 254 para 446
municípios (+75%) no Centro-Oeste, em apenas 30 anos
Como
seria de se esperar, esta urbanização tão rápida da população
num país eufemisticamente chamado de “em desenvolvimento” e
agora de “emergente”, com limitados recursos para investimento em
infraestrutura, só poderia resultar em enormes déficits de
habitação e de serviços públicos de infraestrutura a ela
associados (saneamento, transportes urbanos, telecomunicações,
etc.) além de carências sérias nos serviços sociais (educação,
saúde, assistência social).
Distorções
na ocupação territorial na escala nacional
Não
cabe discutir aqui os detalhes e as implicações do extraordinário
desenvolvimento tecnológico da agricultura e da pecuária
brasileiras, que nos tornaram grandes produtores e exportadores de
proteína animal, grãos (complexo soja), cana de açúcar (açúcar,
etanol e bagaço), frutas etc., colocando o Brasil na posição de
segundo maior exportador de alimentos4
do mundo.
Mas
é importante ressaltar que o desenvolvimento da pecuária
brasileira, em particular, traduzido pelo aumento significativo dos
rebanhos, inclusive do bovino, e pelo crescimento das taxas de
desfrute, não modificaram, porém, a disposição dos grandes e
médios fazendeiros de manter a criação extensiva de gado, com
baixa taxa de ocupação dos pastos. O objetivo dessa estratégia é
manter suas terras como reserva de valor e ocupá-las para evitar o
risco de invasões ou de vê-las declaradas como improdutivas e
passíveis de inclusão nos programas de reforma agrária.
A
explicação contida nesses dois parágrafos é necessária para
compreender porque a pecuária extensiva continuou sendo a atividade
antrópica que ocupa a maior área do território brasileiro5,
conforme ilustram os Mapas I-1 e I-2, seguintes.
Neles
se observa que, exceto pela Região Sudeste, a dispersão das ações
humanas (assentamentos humanos e atividades econômicas) no espaço
brasileiro (áreas vermelhas do Mapa I-1) caracteriza baixas
densidades de atividades produtivas e grandes distâncias entre os
núcleos urbanos fabris mais concentrados.
Isso
significa maior dificuldade de articulação de cadeias produtivas e
das redes de cidades integradas6,
sendo que as grandes distâncias exigem pesados investimentos para
construir e manter infraestruturas econômicas adequadas de
transportes, telecomunicações, energia elétrica e distribuição
de petróleo e gás, gestão governamental etc.
MAPA
I - 1
ÁREAS ANTRÓPICAS DO TERRITÓRIO
NACIONAL
Fonte:
IBGE, elaboração da Secretaria de Assuntos Estratégicos da
Presidência da República (SAE-2011)
As
áreas acinzentadas correspondem a espaços cuja cobertura vegetal
foi preservada, destacando-se no Mapa I-1 a ampla área da Floresta
Amazônica, bem como as manchas correspondentes ao Cerrado, à
Caatinga (Floresta Branca) e ao Pantanal Matogrossense, ainda pouco
povoadas.
O
Mapa I-2 seguinte permite avaliar as áreas ocupadas pela pecuária
extensiva (cores vermelha e amarela) e intensiva (verde e azul
escuro), que, em conjunto, representam 20% de todo o território
brasileiro, penetrando inclusive na Amazônia.
MAPA
I – 2
ÁREAS DE PECUÁRIA E SUA TAXA DE
OCUPAÇÃO DOS PASTOS
Fonte:
IBGE, elaboração da Secretaria de Assuntos Estratégicos da
Presidência da República (SAE-2011)
Os
Mapas I-1 e I-2 evidenciam três fatos importantes, nem sempre
percebidos pelos analistas: primeiro,
que a Amazônia está relativamente preservada, ao contrário do que
se depreenderia das denúncias divulgadas na mídia, o que não
significa, porém, que se deva descurar de sua proteção; segundo
que há ainda muito espaço, relativamente bem infraestruturado
(estradas e outros recursos logísticos, redes de energia e de
telecomunicações), ocupado por pecuária de baixa densidade, a qual
deverá ser substituída, nas próximas décadas, por lavouras de
alimentos ou de energia, sem pressionar os biomas amazônicos, de
extraordinária importância para o clima do País e do mundo;
terceiro,
que a ocupação do território brasileiro segundo o “modelo
liberal”, isto é, submetido simplesmente às leis do mercado,
buscando apenas os melhores resultados econômicos para seus
proprietários, sem obedecer a qualquer planejamento, ou regulação
estatal ou de instituições da sociedade, foi desnecessariamente
predatório do meio ambiente e, diga-se de passagem, muito
predatório.
Cabe
uma ressalva ao comentário acima, da ocupação segundo o modelo
liberal, porque esta sempre esteve sujeita aos interesses da Defesa
(por exemplo, na faixa de fronteira e no entorno das instalações
militares) e, a partir dos anos 1980, também submetida às
exigências do licenciamento ambiental, no caso de atividades de
grande porte ou de impactos significativos sobre os recursos naturais
ou a qualidade de vida das populações próximas.
Esporádicas
políticas públicas regionais de ocupação territorial não deram
certo, como, por exemplo, o PIN-Programa de Integração Nacional7,
que visava transferir para a Amazônia 100.000 famílias nordestinas,
acossadas pela seca de 1969/70. Nos governos civis, pós-regime
militar, nenhuma iniciativa consistente de planejamento/regulação
de ocupação racional do espaço pode ser registrada, apesar das
tentativas dos Ministérios do Planejamento e do Interior (agora da
Integração). Na última década, o Ministério das Cidades vem
cuidando de regular a ocupação dos espaços urbanos, com sucesso
discutível.
A
falta de planejamento territorial – Uma possível tarefa para a FNE
Como
dito anteriormente, sempre vigeu no Brasil o modelo liberal de
produção do espaço, isto é sua construção se deu pelas
dinâmicas econômicas e sociais determinadas pelo livre mercado. Foi
assim, desde a colônia, com economia extrativista e
agro-exportadora, até a primeira metade do século passado, quando o
País começou seu processo acelerado de industrialização, até a
crise fiscal e cambial dos anos 80s, que a estancou. A ocupação
obedecendo ás diretrizes ditadas pelo mercado prosseguiu depois, com
os processos característicos da financeirização da riqueza que se
observa nos últimos 30 anos, inclusive no que diz respeito com a
especulação imobiliária urbana e rural..
De
acordo com tal modelo, o espaço é visto como um vazio a ser
preenchido “naturalmente”, conforme os interesses dos atores,
prevalecendo aqueles empreendimentos mais “rentáveis”, isto é
que trazem melhores resultados econômicos para seus promotores (ex.:
uma fábrica vai se localizar próximo às fontes de suas
matérias-primas, ou onde há mão de obra de qualidade, ou próxima
ao mercado de seus produtos, o que for mais racional do ponto de
vista dos cálculos econômicos).
Eventualmente,
há restrições de ordem ambiental a serem atendidas e o
empreendimento poderá ser forçado a buscar uma outra localização,
ainda que não seja a melhor. Às vezes os governos impõem
restrições ao uso daquela localização-ótima, porque precisa dela
para fazer concessões ou compensações para grupos sociais mais
vulneráveis ou para implantar empreendimentos públicos. O espaço é
visto, nesse caso, sob o enfoque do planejamento modernista, isto é,
tendo como referência uma visão ideal da cidade ou da região, cujo
alcance depende do ordenamento físico-territorial, estabelecido por
um zoneamento
de acordo com as “vocações”, com parâmetros
urbanísticos/arquitetônicos de ocupação e de uso do solo, índices
para a taxa de ocupação, coeficientes de aproveitamento, tamanhos
mínimos dos lotes, recuos, afastamentos etc.
Há,
porém, vasta literatura oriunda da escola do pensamento crítico às
teorias liberais do planejamento territorial, oriunda de
especialistas europeus e latino-americanos, cujas teses
fundamentam-se na noção de que o espaço
ocupado é uma construção social.
Ou seja, que o ambiente (espaço) construído é decorrência das
tensões e da disputa entre os interesses dos diversos atores
sociais, nele presentes ou não, a saber: fazendeiros, outros
empreendedores, trabalhadores rurais e urbanos, movimento dos sem
terra, tradings
de produtos agrícolas, fornecedores de insumos consumidos no campo,
ou proprietários urbanos, compradores de moradia, movimento dos sem
teto, locatários etc, segundo a lógica das relações que mantêm
entre si. Entre estas, as relações moldadas pelas leis que regulam
a propriedade fundiária, lei de herança e sucessões, diferentes
tipos de relações de trabalho, aplicações financeiras
alternativas ao investimento na terra como reserva de valor, etc.
Tal
noção de espaço socialmente construído pode ser aplicada tanto às
análises referentes a épocas mais remotas, como as cidades e
regiões da Antiguidade Clássica (Roma, o Peloponeso etc.), quanto
aos espaços rurais ou urbanos das sociedades atuais do mundo
capitalista, ou das que se organizam sob a égide do comunismo ou do
socialismo democrático.
Em
cada caso, os processos de desenvolvimento regional ou urbano têm de
ser compreendidos a partir da leitura dos interesses ─ quase sempre
conflitantes ─ dos diferentes atores que interagem no espaço, e de
como eles “jogam” na arena política, inclusive procurando
colocar o Estado ao seu lado, na defesa de seus interesses.
Antes
do golpe militar de 1964, chegaram a ser ensaiados movimentos de
planejamento regional, com a criação pelo governo Juscelino de uma
agência regional de desenvolvimento, a SUDENE8
(1959), extinta em 2001, sob denúncias de captura
pelas elites locais e de corrupção. A SUDENE, em seus quarenta anos
de vida, falhou em sua missão de reduzir as distâncias
econômico-sociais do Nordeste em relação ao Sudeste e ao Sul. Em
parte tal falha se deveu ao fato de que conviviam nos quadros daquela
instituição visões antagônicas sobre qual modelo de ocupação do
espaço deveria prevalecer. O debate intenso entre aquelas correntes
nunca convergiu.
Apesar
disso, os governos militares criaram a SUDAM, a SUDECO e uma agência
especial para a recuperação econômica do Espírito Santo, com o
mesmo objetivo de promover o desenvolvimento da Amazônia, do Centro
Oeste e daquele Estado. Todas fracassaram, igualmente.
Essa
discussão sobre o desenvolvimento das regiões mais atrasadas se deu
no bojo da discussão mais geral das “reformas de base” durante o
curto período em que Jango esteve no poder. Entre ela se destacavam
os temas da reforma agrária e da reforma urbana, que, certamente,
tiveram papel crucial na reação das forças conservadoras que se
aglutinaram para derrubar o governo Goulart.
O
que importa é que nesse período, ao lado do planejamento setorial
que vinha fortalecido do governo JK, com os Grupos Setoriais, haviam
exercícios sérios de planejamento regional, visando objetivos bem
definidos, mas sem apoio político suficiente para captar e aplicar
os recursos econômico-financeiros necessários à sua implementação.
Já
existia, naquela altura, um certo grau de compreensão de que as
políticas setoriais (saúde, educação, habitação, transportes,
energia etc.), num determinado território ou região, não poderiam
ser otimizadas se implementadas de forma autônoma e segmentada. Que
era necessário agir de forma integrada e com uma visão holística,
para se obter as sinergias potencialmente possíveis entre os
aspectos sociais e econômicos ─ hoje acrescentaríamos os aspectos
ambientais. Ou seja, o
território era a plataforma onde as políticas públicas deveriam
ser integradas e compatibilizadas
de modo a obter o maior rendimento possível dos recursos públicos
aplicados.
Após
o golpe de 1964, a ênfase do planejamento nacional voltou a ser
setorial ─ coerentemente com a organização das ações
governamentais estruturadas por ministérios ─, não obstante a
preservação das agências de desenvolvimento regional, com vistas a
satisfazer interesses políticos locais e organizar suas práticas
clientelistas de distribuição de recursos.
Em
1973, através de leis complementares (LC no14/73
e LC no
20/74),
foram criadas nove Regiões Metropolitanas (São
Paulo, Belo Horizonte, Porto Alegre, Recife, Salvador, Curitiba,
Belém, Fortaleza e, por último, Rio de Janeiro),
definindo de forma autoritária quais seriam os municípios que as
integrariam e que funções urbanas seriam consideradas “serviços
comuns de interesse metropolitano”, a saber: planejamento integrado
do desenvolvimento econômico-social, saneamento básico, uso do
solo, transportes e sistema viário, gás canalizado, aproveitamento
dos recursos hídricos e controle da poluição, além de outros que
fossem incluídos por lei federal.
Não
foi surpresa, no regime militar e centralizador das decisões na
esfera federal, que o planejamento fosse feito ignorando a opinião e
as atribuições dos Estados e Municípios. Com um modelo único e
rígido de gestão aplicável a todas as RM, sem possibilidade de
adaptações às peculiaridades de cada uma delas — cujas
características eram bastante diferentes uma das outras — o
sistema estava fadado ao insucesso.
Os
governadores, eleitos indiretamente, tinham responsabilidades naquele
modelo de gestão metropolitana, mas não tinham legitimidade
política nem recursos fiscais para implementar os programas que iam
sendo desenhados. O fracasso foi mais retumbante ainda pelo fato de
que se acreditava, em meados dos anos 1970, que o “milagre
econômico” permitiria ao Governo Federal bancar os projetos
concebidos pelos órgãos de planejamento urbano-metropolitano, o que
se mostrou equivocado na medida em que ao final daquela década já
estava desenhada a profunda crise fiscal dos anos 1980.
Nos
estertores do regime militar e com a escalada inflacionária que se
seguiu à redemocratização, nos Governo Sarney e Collor-Itamar, a
atividade de planejamento tornou-se inviável e caiu em desuso, mas a
Constituição de 1988 deixou algumas sementes que iriam frutificar
nos anos seguintes.
A
primeira,
foi o reforço da Federação, por meio da descentralização
política (atribuição de competências aos municípios) e dos
recursos públicos, inclusive com a elevação dos municípios à
condição de entes federados, com alguma autonomia fiscal. A segunda
foi o estímulo à participação da sociedade na formulação das
macropolíticas públicas, contido especialmente nos artigos 182 ─
que, entre outras coisas, atribuiu aos municípios a competência
para a execução da política de desenvolvimento urbano e exigiu
daqueles com mais de 20.000 habitantes a elaboração de Planos
Diretores aprovados pelas Câmara de Vereadores, depois complementado
pelo Estatuto das Cidades (Lei 10.257, de 2001) ─ e o artigo 187,
que trata da política agrícola, a ser “planejada e executada com
a participação efetiva do setor de produção, envolvendo
produtores e trabalhadores rurais”.
A
redação do Capítulo da Constituição que trata da política
urbana foi originalmente formulada e apresentada por meio da Emenda
Popular da Reforma Urbana, assinada por cerca de 250.000 pessoas,
mobilizadas pelo Movimento Nacional da Reforma Urbana. O MNRU foi
organizado em torno dos movimentos sociais de luta pela moradia, por
profissionais (advogados, engenheiros, arquitetos e urbanistas etc.)
que militavam no setor de Habitação, para resgatar o tema da
“reforma urbana” dos anos 1960.
O
MNRU conquistou outras vitórias árduas (CYMBALISTA-2007), tal como
o já citado Estatuto das Cidades, que tramitou durante anos no
Congresso Nacional até ser aprovado, bem como a criação, logo no
início do governo Lula, do Ministério das Cidades (2003), do
Conselho das Cidades (ConCidades) (2004), órgão consultivo do
Ministério com ampla representação da sociedade organizada, do
Sistema Nacional de Política Habitacional de Interesse Social (Lei
11.124/2005) e do Fundo Nacional de Habitação Social.
Já
o Capítulo que trata da Política Agrícola e Fundiária e da
Reforma Agrária foi objeto de um dos debates mais acirrados da
Assembléia Nacional Constituinte, em que cada vírgula do texto foi
negociada e os temas críticos foram decididos pelo voto.
Infelizmente,
porém, nenhum desses dispositivos trata do planejamento referido ao
território. Deste modo, prevalece apenas, no plano das boas
intenções, a preocupação contida no disposto no Art 174, da CF,
que atribui ao Estado
“....as
funções de fiscalização, incentivo e planejamento, sendo este
determinante para o setor público e indicativo para o setor privado”
§10
A
lei estabelecerá as diretrizes e bases do planejamento do
desenvolvimento nacional equilibrado, o qual incorporará e
compatibilizará os planos nacionais e regionais de desenvolvimento”.
Ou
seja, remete sua regulamentação a uma lei ordinária a ser
elaborada para estabelecer as diretrizes e bases do planejamento.
O
“desenvolvimento equilibrado”, nesse caso, deve ser entendido não
apenas do ponto de vista sócio-econômico e ambiental, mas também
no contexto regional e urbano, isto é, do planejamento referido ao
território. Vale dizer que o §10
do Art 174 aponta no sentido da Gestão Territorial, a exemplo do
que fazem outros países.
Identifica-se,
nesse ponto, uma lacuna constitucional que poderia ser transformada
numa bandeira a ser empunhada pela Federação
Nacional dos Engenheiros, a qual teria toda a legitimidade para
conduzir uma mobilização nacional visando angariar apoio, na
Sociedade e no Congresso Nacional, para a elaboração e aprovação
de uma lei ordinária que regulamentasse o citado parágrafo/artigo
da CF
A
justificativa para uma iniciativa como essa da FNE estaria dada pelo
descalabro que tem sido, nos últimos anos, a implantação de
programas e projetos de infraestrutura, no Brasil, com erros
gritantes nos planos e projetos, atrasos sistemáticos na sua
execução e orçamentos estourados, simplesmente porque não foram
precedidos de prévio planejamento geral e específico para obras de
grande porte.
Projetos
completamente inexeqüíveis ou absurdamente fora da realidade
recebem “ordem de início” com base apenas em “projetos
básicos”, sem que haja levantamentos prévios indispensáveis
(sondagem do solo, estudos de impactos ambientais, topografia etc.)
para a elaboração do projeto executivo nem orçamento e cronograma
detalhados.
Quem
compara a implementação de projetos de grande porte (Itaipu,
Tucuruí, metrô de São Paulo etc.), no passado, com os programas de
obras hoje em execução fica com a impressão de que a Engenharia
Brasileira involuiu, apesar dos avanços técnicos nos métodos
construtivos e dos novos equipamentos e materiais disponíveis.
Pode-se
invocar, na defesa daquela bandeira ainda, a experiência
internacional.
A
França, por exemplo, pratica o chamado aménagement
du territoire
(gestão do território) desde 19509
e, indiscutivelmente, apresenta razoável equilíbrio espacial na
distribuição de sua população e de suas atividades econômicas.
Como a França é uma república unitária, o governo central tem
papel preponderante na implementação das políticas públicas de
gestão do território (como, por exemplo, a concessão de subsídios
a certas atividades rurais para reter a população do campo10,
em propriedades rurais ou em pequenas vilas do interior)
Outros
países europeus têm tradições diferentes do estilo francês de
gestão do território, como é o caso da Alemanha, república
federativa onde é grande a autonomia dos Estados Federados. No
entanto, os alemães praticam o chamado “desenvolvimento espacial”.
A Espanha, país unitário e monarquia constitucional, com
departamentos (comunidades) de grande autonomia, também pratica o
planejamento territorial11,
inclusive no nível das Comunidades (ou Departamentos) Autônomas,
como a Catalunha ou o País Basco. A gestão do território ao estilo
francês tem como objetivos: estabelecer a justiça espacial e
corrigir as disparidades no uso do espaço (da terra), atender a uma
exigência econômica, e promover a especialização funcional dos
territórios, ou regiões, de modo a otimizar sua ocupação.
De
forma geral, o planejamento territorial tem como objetivo ordenar o
espaço afetado pelas atividades humanas, sociais e econômicas
buscando as condições para que o crescimento e o desenvolvimento
sejam sustentáveis. No caso do Brasil, em que a Constituição
postula o caráter indicativo do planejamento para o setor privado,
deve-se buscar compatibilizar o funcionamento da economia de mercado
com os direitos básicos das pessoas, o que pressupõe a elaboração
democrática das diretrizes aplicáveis aos mecanismos de incentivos
a ações e programas no sentido de corrigir, ou compensar, as
distorções de mercado à escala regional.
O
Brasil tem algumas experiências interessantes de planejamento
referido ao território e com participação da sociedade ─ como é
o caso dos COREDES, no Rio Grande do Sul e Santa Catarina, que tem
regiões de planejamento bem definidas ─ que mereceriam ser
estudadas e eventualmente estendidas a outros Estados da Federação.
O
Governo Lula também criou12
o Ministério da Integração Nacional, com as atribuições de:
- formulação e condução da Política Nacional de Desenvolvimento Regional - PNDR;
- formulação dos planos e programas regionais de desenvolvimento;
- estabelecimento de estratégias de integração das economias regionais;
- acompanhamento e avaliação dos programas integrados de desenvolvimento nacional;
- obras contra as secas e de infraestrutura hídrica;
- formulação e condução da política nacional de irrigação;
- ordenamento territorial;
além
de outras atribuições.
Apesar
das boas intenções da equipe técnica do Ministério da Integração
Nacional, a primeira versão de uma Política Nacional de
Desenvolvimento Regional-PNDR não vingou, principalmente porque o
fundo de recursos previsto para financiar sua implementação não
foi aprovado pelas autoridades econômicas e pela cúpula do Governo
Federal. A segunda versão da política, a chamada PNDR-II, proposta
em 2012, também não saiu do papel.
Como
paliativo, o Ministério da Integração Nacional passou a criar as
chamadas Rotas de Integração Nacional, que são redes de arranjos
produtivos locais (APL), territorial e setorialmente interligados,
que promovem a inovação, diferenciação, competitividade e a
lucratividade dos empreendimentos associados ao APL.
Estão
operando as Rotas do Cordeiro (Semiárido Nordestino), da Fruta
(macro-regiões Norte, Nordeste e Sul), do Peixe (macro-regiões
Norte e Nordeste) e do Mel (Nordeste). O Ministério da Integração
se dedica também às políticas de irrigação e da infraestrutura
hídrica, sendo responsável também pelo Projeto de Transposição
do Rio São Francisco, de grande impacto regional, mas um caso
emblemático de problemas de toda ordem em sua execução, exatamente
pela falta de planejamento prévio ao início das obras.
Este
projeto de transposição de bacia com as águas do Rio São
Francisco, juntamente com o projeto da Ferrovia Norte-Sul, também de
enormes impactos para o desenvolvimento de um grande região,
poderiam ser cases
a serem estudados e servirem de exemplos sobre como
as coisas não devem ser feitas sem planejamento,
bem como para animar a eventual campanha de mobilização da FNE pela
regulamentação do §10,
do Artigo 1’74 da Constituição Federal.
Infelizmente,
não se observa entre as preocupações até aqui expressadas pelos
três principais candidatos à Presidência da República qualquer
referência à questão do planejamento regional com vistas à
redução das desigualdades regionais, não obstante um desses
candidatos já ter sido ministro da Pasta da Integração.
O
mais importante é que, se e quando forem retomados com efetividade
os planejamentos regional e urbano, sejam levados em conta, neste
último, as atuais reivindicações das populações urbanas,
notadamente das capitais dos Estados, apresentadas nas manifestações
de rua, de forma dramática e indignada, inclusive com violência, e
nos protestos difundidos em meios digitais.
O
relógio da consciência social sobre os problemas urbanos
Não
resta dúvida que a percepção coletiva sobre os problemas públicos
é um processo lento e que depende de várias variáveis: a cultura
local; o conhecimento do problema ou a experiência prática em
outras localidades, no mesmo país e no exterior; o grau de
politização dos cidadãos, a atuação dos meios de comunicação
desvelando a natureza e profundidade das questões reais ou ocultando
seus aspectos crucias, etc.
A
deflagração das manifestações de junho de 2013, cujo estopim foi
o aumento do custo das passagens de ônibus, que se repete todos os
anos, colheu de surpresa a todos, inclusive os que estudam o
comportamento da sociedade. Primeiro, porque a questão do alto preço
e da baixa qualidade dos transportes urbanos nas grandes cidades,
objeto do Movimento Passe Livre, existe há anos e nunca havia
provocado, antes, a ira da sociedade, de usuários e não-usuários
do transporte coletivo.
Segundo,
porque desatou simultaneamente a insatisfação da população com
inúmeras outras questões, algumas das quais novas ─ como o
questionamento das prioridades dos gastos públicos e da qualidade
dos serviços públicos convencionais (criou-se o Padrão FIFA, que
passou a ser exigido na saúde, na educação etc.) ─, mudando
assim o comportamento de indiferença tradicional do brasileiro, em
geral, com respeito à coisa pública.
Com
uma breve, mas intensa, experiência pessoal na gestão pública dos
transportes intermunicipal de passageiros da segunda região
metrópole do País, há mais de uma década, me fiz a pergunta:
─ Se
o povo fluminense conhecesse o funcionamento dos diversos modais de
transportes das melhores cidades européias, será que aceitaria
passivamente continuar a ser “tratado como gado” nas estações
de trens urbanos, nos ônibus ou nas barcas que servem à região
metropolitana do Rio?
É
muito bom para os controladores e gestores das concessionárias de
transporte público que seus usuários nunca tenham viajado para a
Europa e não conheçam o padrão de qualidade dos serviços de
transportes públicos de suas principais cidades. Mas, a partir de
agora, apesar de não terem um padrão de referência, os clientes do
sistema de transportes públicos passaram a exigir do poder
concedente e das prestadoras de serviços muito mais qualidade. Os
usuários fartaram-se de ser sacrificados em termos de duração das
viagens, desconforto físico, estresse psíquico e, naturalmente,
pelo gasto com deslocamentos.
Isso,
não obstante as pessoas estarem vendo que pela primeira vez, em
muitos anos, estão sendo investidos vultosos recursos na ampliação
e construção de novas vias e novos meios de transporte. Reagem
negativa e raivosamente ao fato de que tais melhorias não estão
sendo feitas em respeito às suas necessidades de melhoria dos
serviços, mas sim para cumprir um caderno de encargos exigidos pelos
organizadores da Copa e das Olimpíadas.
O
mesmo se aplica aos manifestantes que querem ver atendidos os seus
direitos, mediante o acesso à habitação popular, aos serviços de
saúde (há uma fila de 13.000 pessoas, somente no Estado do Rio de
Janeiro, aguardando, há meses, a oportunidade de fazer uma cirurgia
nos hospitais públicos), de educação etc.
A
esta conscientização da população, ainda que retardada, com
relação aos seus direitos de desfrutar de serviços públicos de
qualidade deveriam corresponder ações concretas dos governantes e
dos políticos, após uma perplexidade inicial que abalou a todos.
Mas o que se observa não é isso. O relógio do público (sua
agenda) foi colocado na “hora certa” e agora quer-se discutir, no
ano eleitoral, quais as medidas que vão constar da plataforma dos
candidatos para equacionar os problemas levantados.
O
Relógio dos Políticos e os Recursos para Melhorar a Gestão das
Cidades
As
reações dos governos, em seus diferentes níveis, às manifestações
de protesto das populações, especialmente das grandes cidades, não
foram felizes. Ou ofereceram platitudes inalcançáveis, como a
reforma política, ou apenas postergaram aumentos de tarifas já
decididos, para momento mais oportuno, ou ficaram omissos.
Afinal
não há recursos adicionais para fazer outras obras além das que já
estavam programadas. O que certamente poderia ser muito melhorado,
sem grandes custos adicionais, seria a gestão das cidades
brasileiras.
Nos
Transportes públicos nada foi feito, pois falta criatividade para
melhorar a operação e os governos não ousam contrariar por muito
tempo os interesses dos operadores privados dos diferentes modais de
transportes, ainda mais em ano eleitoral. Na Saúde também não
houve mudanças significativas, pois, é preciso reconhecer, para
promover qualquer alteração nesse setor, sem correr o risco de um
desastre, é necessário tempo para amadurecer soluções e para
implementá-las. Na Habitação segue acelerado o programa Minha
Casa, Minha Vida, agora em sua terceira fase, com os mesmos riscos de
antes em matéria de escolha dos terrenos, qualidade das obras e de
falta de infraestrutura, os quais poderão repercutir mais à frente.
Houve
um recuo dos movimentos de protesto legítimo para evitar que suas
militâncias fossem aproveitadas, como escudo e como coro, pelos
manifestantes violentos. Mas as questões motivadoras dos protestos
não se converteram em problemas de políticas públicas, isto é,
não entraram de fato nas agendas dos diferentes governos. Os
insatisfeitos, que são muito mais numerosos do que os que saíram às
ruas, continuam insatisfeitos, Talvez mais que antes, pois não
receberam as respostas esperadas do Poder Público. E vão se
manifestar oportunamente, nas ruas e nas urnas.
No
entanto, o relógio dos políticos ainda não os despertou, e não se
percebe, às portas do início da campanha eleitoral de 2014, que os
candidatos estejam gestando propostas convincentes — que prometerão
aos eleitores para captar seus votos — de soluções para aquelas
questões.
É
de se esperar que o desempenho do eleitorado brasileiro apresente
recordes nas proporções de votos brancos e nulos, como forma de
expressar de forma clara seu desejo mudancista e de destravar as
medidas políticas necessárias e consideradas inadiáveis
(especialmente as reformas política e tributária).
2.
Brevissimo Diagnóstico das Cidades Brasileiras
O
que se apresenta neste capítulo não é propriamente um diagnóstico
do urbano no Brasil, o que demandaria muito trabalho e muito espaço
para apresentar os resultados. Trata-se, na verdade de um recorte
feito por critérios baseados naquilo que parece ao autor serem os
aspectos mais importantes, sem aprofundamento do estudo das causas
dos principais problemas identificados.
É,
portanto, um exame parcial da realidade e viesado em função das
experiências do autor na formulação e gestão de políticas
públicas em diversos setores da administração pública federal e
estadual, além de suas preferências políticas.
Uma
coisa que salta aos olhos, porém, não consta deste diagnóstico
expedito, mas fica registrado para a reflexão do leitor: as cidades
brasileiras estão se tornando cada vez mais feias, não apenas nas
áreas de sub-habitação e nos bairros populares, mas também nas
áreas centrais e inclusive nos bairros nobres. Isto parece um
contra-senso num País que gerou alguns dos melhores arquitetos do
mundo.
A
Importância das Cidades
Conforme
discutido no capítulo anterior, aproximadamente 5.200 cidades, de
diferentes portes, concentram atualmente 85% da população
brasileira. Suas atividades econômicas representam mais de 90% do
valor adicionado que compõe o PIB, bem como dos postos de trabalho.
Para
além da concentração demográfica e econômica, são as cidades as
responsáveis pela competitividade nacional de cada país em seu
relacionamento com o resto do mundo, pois nelas se encontram os
recursos humanos mais preparados, em termos de escolaridade e
treinamento, as melhores infraestruturas de serviços públicos
essenciais (saneamento, energia, telecomunicações e transportes,
educação, saúde, segurança pública, justiça etc.), as mais
modernas plantas produtivas, os métodos de gestão mais eficientes e
as melhores instituições que moldam o funcionamento dos mercados.
No
Brasil, o discurso sobre o aumento da produtividade de nossa economia
costuma ser parcial e enfatiza, primordialmente, o chamado “custo
Brasil”, ou seja: carga tributária elevada, infraestrutura
logística de transportes (principalmente campo-portos) precária,
mau funcionamento da burocracia dos órgãos governamentais e baixa
produtividade da mão de obra. Outros questionam a taxa de cambio. Em
geral, porém, as lideranças e os formadores de opinião ignoram
outros aspectos cruciais da vida urbana que influem decisivamente nos
custos da produção e, portanto, na competitividade, tais como a
fluidez do trânsito e a qualidade e custo das telecomunicações.
Ainda
que tendo como pano de fundo a ocupação antrópica do território
como um todo, com preocupação especial quanto à preservação das
imensas áreas ainda florestadas e com a gestão adequada dos
recursos hídricos — tão abundantes quanto mal tratados —, o
foco do planejamento territorial do País deveria estar concentrado
nas cidades, as quais, como será analisado na seção seguinte,
estão estruturadas e hierarquizadas em redes de relacionamento entre
si.
Redes
de cidades brasileiras
O
planejamento regional e do desenvolvimento urbano de cada município,
previsto na CF, não pode deixar de levar em conta a morfologia da
rede de cidades brasileiras, estudada pelo IBGE desde 1972, a partir
do complexo de interações espaciais levantadas por meio de
pesquisas sistemáticas dos fluxos materiais (bens, serviços,
pessoas) e de informações que se deslocam de um ponto em direção
a outro, distante. Examina-se também as relações horizontais entre
os núcleos urbanos, principalmente no tocante à gestão de serviços
públicos e das atividades empresariais.
Os
levantamentos e análises do IBGE permitem construir, assim, redes
hierarquizadas
de cidades, que definem um sistema de localidades centrais — cujas
regiões de influência são constituídas no entorno dos centros
mais importantes — que articulam os fluxos materiais em função
das atividades econômicas (trabalho, compras, serviços, produção,
gestão empresarial etc.) e não-econômicas (estudo, serviços,
gestão governamental, etc.). Pode-se, ainda, examinar essas relações
entre as cidades com base em um sistema
reticular,
levando em conta como cada cidade funciona na perspectiva de ser um
nó da rede mundial de cidades. A metodologia da pesquisa é descrita
em detalhes no documento do Instituto (IBGE-2007).
O
que importa aqui é esclarecer que o IBGE classifica as 5.280 cidades
brasileiras em cinco grandes níveis, por sua vez subdivididos em
dois ou três subníveis, a saber:
- Metrópoles – são os 12 principais centros urbanos do País, que se caracterizam por seu grande porte e por fortes relacionamentos entre si, além de, em geral, possuírem extensa área de influência direta. O conjunto foi dividido em três subníveis, segundo a extensão territorial e a intensidade destas relações:
a.
Grande
metrópole nacional
– São Paulo, o maior conjunto urbano do País, com 19,5 milhões
de habitantes, em 2007, e alocado no primeiro nível da gestão
territorial;
b.
Metrópole
nacional
– Rio de Janeiro e Brasília, com população de 11,8 milhões e
3,2 milhões em 2007,respectivamente, também estão no primeiro
nível da gestão territorial. Juntamente com São Paulo,constituem
foco para centros localizados em todo o País; e
c.
Metrópole
– Manaus, Belém, Fortaleza, Recife, Salvador, Belo Horizonte,
Curitiba, Goiânia e Porto Alegre, com população variando de 1,6
(Manaus) a 5,1 milhões (Belo Horizonte), constituem o segundo nível
da gestão territorial. Note-se que Manaus e Goiânia, embora estejam
no terceiro nível da gestão territorial, têm porte e projeção
nacional que lhes garantem a inclusão neste conjunto.
2.
Capital
regional
– integram este nível 70 centros que, como as metrópoles, também
se relacionam com o estrato superior da rede urbana. Com capacidade
de gestão no nível imediatamente inferior ao das metrópoles, têm
área de influência de âmbito regional, sendo referidas como
destino, para um conjunto de atividades, por grande número de
municípios. Como o anterior, este nível também tem três
subdivisões. O primeiro grupo inclui as capitais estaduais não
classificadas no nível metropolitano e Campinas. O segundo e o
terceiro, além da diferenciação de porte, têm padrão de
localização regionalizado, com o segundo mais presente no
Centro-Sul, e o terceiro nas demais regiões do País. Os grupos das
Capitais regionais são os seguintes:
a.
Capital
regional A
– constituído por 11 cidades, com medianas de 955 mil habitantes e
487 relacionamentos;
b.
Capital
regional B
– constituído por 20 cidades,com medianas de 435 mil habitantes e
406 relacionamentos; e
c.
Capital
regional C
– constituído por 39 cidades com medianas de 250 mil habitantes e
162 relacionamentos.
3.
Centro
sub-regional –
integram este nível 169 centros com atividades de gestão menos
complexas, dominantemente entre os níveis 4 e 5 da gestão
territorial; têm área de atuação mais reduzida, e seus
relacionamentos com centros externos à sua própria rede dão-se, em
geral, apenas com as três metrópoles nacionais. Com presença mais
adensada nas áreas de maior ocupação do Nordeste e do Centro-Sul,
e mais esparsa nos espaços menos densamente povoados das Regiões
Norte e Centro-Oeste, estão também subdivididos em grupos, a saber:
- Centro sub-regional A – constituído por 85 cidades, com medianas de 95 mil habitantes e 112 relacionamentos; e
- Centro sub-regional B – constituído por 79 cidades,com medianas de 71 mil habitantes e 71 relacionamentos.
4.Centro
de zona –
nível formado por 556 cidades de menor porte e com atuação
restrita à sua área imediata; exercem funções de gestão
elementares. Subdivide-se em:
- Centro de zona A – 192 cidades, com medianas de 45 mil habitantes e 49 relacionamentos. Predominam os níveis 5 e 6 da gestão territorial (94 e 72 cidades,respectivamente), com nove cidades no quarto nível e 16 não classificadas como centros de gestão; e
- Centro de zona B – 364 cidades, com medianas de 23 mil habitantes e 16 relacionamentos. A maior parte, 235, não havia sido classificada como centro de gestão territorial, e outras 107 estavam no último nível daquela classificação.
- Centro local – as demais 4 473 cidades cuja centralidade e atuação não extrapolam os limites do seu município, servindo apenas aos seus habitantes, têm população dominantemente inferior a 10 mil habitantes (mediana de 8 133 habitantes).
Note-se
que a Grande Metrópole Nacional, São Paulo, tem projeção em todo
o País, e sua rede abrange todo o Estado de São Paulo, parte do
Triângulo Mineiro e do sul de Minas Gerais, estendendo-se a oeste
pelos Estados de Mato Grosso do Sul, Mato Grosso, Rondônia e Acre,
compreendendo 1028 municípios com uma população de 51 milhões de
habitantes, em 2007. A rede de São Paulo polarizava, portanto, cerca
de 28,0% da população brasileira e 40,5% do Produto Interno Bruto
(calculado por municípios em 2005).
Já
a Metrópole do Rio de Janeiro constitui uma rede de projeção
imediata no próprio estado e no Espírito Santo, em parcela do sul
do Estado da Bahia, e na Zona da Mata, em Minas Gerais, onde tem
influência dividida com Belo Horizonte, abrangendo 264 municípios,
onde viviam 21 milhões de habitantes em 2007. Com área e população
polarizadas bem mais reduzidas, quando comparadas à rede da Grande
Metrópole Nacional, a segunda rede do País conta com 11,3% do total
de habitantes e 14,4% do PIB nacional.
As
redes de cidades são, portanto, fundamentais para a compreensão das
dinâmicas urbanas e para o planejamento setorial dos transportes
(locais, intermunicipais e interestaduais), das telecomunicações,
da educação, da saúde, da segurança pública (o tráfico de
drogas13,
por exemplo, se alinha com as “relações” entre os centros
locais, de zonas, subregionais, regionais e as metrópoles), etc. Só
através da compreensão destas dinâmicas é possível conceber e
implementar políticas públicas setoriais realmente referidas ao
território, com possibilidade de integração com outras, e com
maiores garantias de eficiência, efetividade e eficácia14.
O
mesmo raciocínio é válido para planejar o desenvolvimento urbano
das cidades, previsto no art. 182, § 10,
da CF. O município não é estanque e suas fronteiras são
permeáveis a relações interurbanas, que afetam a vida de seus
munícipes. As cidades do Rio de Janeiro e de São Paulo, por
exemplo, recebem todos os dias centenas de vans que trazem milhares
de passageiros de outros municípios para fazer tratamento de saúde
naquelas capitais.
O
Mapa II seguinte ilustra como se distribuía, em 2007, a Rede Urbana
do Brasil, com a indicação dos relacionamentos principais que
determinam a região de influência de cada centro.
MAPA
II
REDE
DE CIDADES BRASILEIRAS E SUAS ÁREAS DE INFLUÊNCIA
2007
Evidentemente,
as dimensões dos problemas urbanos de cada cidade variam conforme
sua classificação numa das categorias acima descritas, além de
outros fatores específicos (geográficos, históricos, sociais,
etc.) não captados pelas variáveis analisadas nas pesquisas do
IBGE.
Para
efeito das discussões apresentadas neste documento, devem ser
consideradas prioritárias aquelas aglomerações urbanas que o IBGE
denomina de “Áreas de Concentração de População – ACP”,
definidas como grandes manchas urbanas de ocupação contínua,
caracterizadas pelo tamanho e densidade da população, pelo grau de
urbanização e pela coesão interna da área, dada pelos
deslocamentos da população para trabalho ou estudo.
As
ACPs têm uma definição diferente daquela das Regiões
Metropolitanas, cuja composição em termos de municípios é
essencialmente política, muitas vezes incluindo unidades
predominantemente rurais e deixando de fora núcleos urbanos
expressivos que, por razões políticas não querem integrar a RM..
As
ACPs se desenvolvem ao redor de um ou mais núcleos urbanos, em caso
de centros conurbados, assumindo o nome do município da capital, ou
do município de maior população. As 40 ACPs, constituídas por
agregação de 336 municípios, são as seguintes:
Manaus,
Belém
Macapá,
São
Luís,
Teresina,
Fortaleza
e Juazeiro do Norte–Crato−Barbalha,
Natal,
João
Pessoa e Campina Grande,
Recife
e Petrolina–Juazeiro (Ba)
Maceió,
Aracaju,
Salvador,
Feira de Santana e Ilhéus−Itabuna,
Belo
Horizonte, Ipatinga–C Fabriciano–Timóteo, Juiz de Fora e
Uberlândia, Vitória,
Rio
de Janeiro, Campos dos Goytacazes e Volta Redonda–Barra Mansa, São
Paulo, Ribeirão Preto e São José do Rio Preto,
Curitiba,
Londrina e Maringá,
Florianópolis
e Joinville,
Porto
Alegre, Caxias do Sul e Pelotas–Rio Grande,
Campo
Grande,
Cuiabá,
Goiânia
e
Brasília.
A
ACP de São Paulo, por seu gigantismo, está subdividida, tendo como
núcleo principal a cidade de São Paulo, enquanto Campinas, Jundiaí,
Santos, São José dos Campos e Sorocaba são seus sub-núcleos. Na
ACP de Porto Alegre, identifica-se uma subdivisão embrionária,
tendo Porto Alegre como núcleo principal e Novo Hamburgo–São
Leopoldo como sub-núcleo.
Bases
de dados do Ministério das Cidades
As
informações básicas sobre as cidades são coletadas pelo IBGE e
oferecem uma riqueza de conhecimentos realmente digno dos países
desenvolvidos. O Ministério das Cidades consolidou as informações
coligidas pelo IBGE com as obtidas de outras fontes, oferecendo assim
uma base de dados de amplo espectro, intitulada “Brasil em
Cidades”, cujos componentes poder ser descritos como a seguir:
Capitais(IBGE)
Municípios
(IBGE)
Microregiões
(IBGE)
Malha
Rodoviária (ANTT)
Rede
Hidrográfica (IBGE)
Estradas
rurais (UFSCAR)
Barragens
(IBGE)
Obras
do Orçamento Geral da União (MinCidades)
Escolas
Públicas (UFSCAR)
Manchas
Urbanas (EMBRAPA)
Setores
Censitários (Centro de Estudos da Metrópole)
Biomas
(IBGE)
Imagens
de Satélite 60cm (IMAGEM)
Imagens
Mundo (ESRI)
Há
uma grande riqueza, também, de imagens, oriundas de várias fontes,
para serem baixadas do sítio eletrônico do Ministério das Cidades.
Para ilustrar o nível de detalhamento das informações oferecidas
pelo sítio eletrônico do IBGE, vale descrever as bases de dados
contidas no seu URL para os Municípios brasileiros
cada
uma delas contendo muitas variáveis. As bases de dados com
informações para cada município são:
▪
Censo
agropecuário 2006
▪
Censo
demográfico 2010
▪
Ensino
(matrículas, docentes, rede escolar)
▪
Cadastro
Central de Empresas
▪
Registro
Civil
▪
Estimativa
da população
▪
Extração
Vegetal e Silvicultura
▪
Finanças
Públicas
▪
Frota
▪
Fundações
privadas e Associações sem fins lucrativos 2010
▪
Índice
de Desenvolvimento Humano
▪instituições
Financeiras
▪Mapa
da Pobreza e da Desigualdade
▪Morbidade
Hospitalar
▪
Pecuária
▪
Pesquisa
Nacional sobre Saneamento Básico 2008
▪Produção
Agrícola Municipal (para alguns tipos de cultura e para lavouras
temporárias e permanentes)
▪Produto
Interno Bruto do Município 2011
▪
Representação
Política
▪
Serviços
de Saúde
Curiosamente,
não está relacionado na base geral de dados do Ministério das
Cidades o SNIS-Sistema Nacional de Informações sobre Saneamento que
contém detalhadas informações sobre cada município de todos os
Estados da Federação, das prestadoras dos serviços de água e
esgoto sanitário (serviços autônomos municipais, empresas
estaduais, concessionárias privadas, principalmente), bem como de
resíduos sólidos.
O
Sistema, acessível em < http://www.snis.gov.br/>,
tem alguns problemas que mereceriam solução. Primeiro, os dados são
publicados com muito atraso (os dados ora disponíveis são de 2011)
e os diagnósticos, além de prejudicados pela qualidade das
informações, estão defasados de 10 anos! Com efeito, o último
diagnóstico corresponde a 2004.
Outra
fonte de informações sobre Saneamento é o Instituto Trata Brasil,
mantido por empresas fabricantes de material empregado nas redes e
estações de tratamento de água e esgotos, que utiliza como base de
dados o SNIS. O Instituto organiza um ranking nacional dos municípios
em matéria de serviços de saneamento.
Diagnósticos
Setoriais
Sem
dúvida, as cidades brasileiras espelham de maneira muito realista os
desequilíbrios e as desigualdades sociais e regionais, em termos de
padrões de qualidade de vida. O Norte e o Nordeste, como seria de se
esperar, apresentam os piores índices em quase todas as variáveis
consideradas.
Os
aspectos examinados a seguir são aqueles que dizem respeito a um bom
ambiente urbano, ou seja, aquele que oferece condições para o
exercício, a um custo razoável, do trabalho, das atividades
econômicas, do laser, da produção e transmissão do conhecimento,
além das demais funções urbanas.
Esses
aspectos cruciais para caracterizar a qualidade de vida urbana são:
habitação, serviços saneamento (água, esgoto sanitário, águas
pluviais e coleta e disposição final de lixo), telecomunicações
(telefonia fixa e móvel, conexão com a internet), transportes
urbanos/mobilidade e serviços de eletricidade, de segurança pública
Os
dois últimos não foram examinados aqui por razões de espaço e
porque: (i) os serviços de eletricidade são os mais abrangentes e
de qualidade razoável em todas as cidades, exceto alguns municípios
amazônicos; (ii) os de segurança pública, pela sua complexidade e
rebatimento em outras questões que não cabe tratar aqui.
Habitação
Como
analisado no primeiro capítulo, a vertiginosa urbanização que
acompanhou o processo de industrialização do País tornaram as
cidades mais complexas, em termos de volumetria e qualidade das
construções, de sistema viário, de localização dos serviços de
interesse comum e de acesso a eles, etc.
Equipe
coordenada pelo arquiteto e urbanista Sérgio Magalhães descreve o
processo histórico de formação das cidades brasileiras, dos
primeiros anos da República até os dias atuais no documento
(CNI-2012), com destaque para a moradia popular nas suas formas
tradicionais: o cortiço, a favela, o loteamento popular e o conjunto
habitacional.
Esclarece
também por que, historicamente, as famílias que até a década dos
1950 moravam predominantemente em habitações alugadas se viu
forçada a migrar para as favelas e loteamentos clandestinos,
construindo suas próprias moradias com a tecnologia construtiva
acessível. Isso por que, até o Estado Novo, os governos não se
sentiam responsáveis por prover casas populares para a população,
considerando que a moradia era um problema privado, das famílias, ou
de quem construía para alugar.
O
governo Getúlio assume como sua a tarefa de construir casas para os
mais pobres e, mesmo depois de sua derrubada, em 1945, os governos
que se sucederam mantiveram políticas públicas de habitação
popular, principalmente baseadas em financiamento a empreendedores
privados e governos subnacionais, inclusive durante o regime militar.
Tal política se estende até o presente com o programa Minha Casa,
Minha Vida.
Ocorre
que a disposição dos governos e dos bancos privados de financiar a
construção de novas moradias é bastante limitada em relação às
necessidades do País. De acordo com o estudo citado (CNI-2012),
entre 1964 e 2004, o número de habitações financiadas pelo Sistema
Financeiro da Habitação (BNH e depois CEF), pelos governos
estaduais e municipais, e mais a banca privada e oficial foi
de 8 milhões de unidades.
No mesmo período, foram
construídas no Brasil nada menos que 40 milhões de unidades.
Ou seja, somente 20% das habitações foram construídas com
financiamento público ou privado.
A
população pobre, sem crédito para obter financiamento, é obrigada
a poupar e promover a auto-construção do modo possível, isto é,
precário e feio. A consequência disso é que 40%
dos novos domicílios,
no período de quatro décadas estudado, foram
erguidos em favelas.
Pelo
menos três quartos dos novos domicílios provavelmente foram
construídos exclusivamente com recursos familiares. Sabe-se que a
moradia é o bem mais dispendioso da família. E a habitação tem
de ser vista como a casa mais as infraestruturas, equipamentos
sociais e os serviços públicos. Assim, a habitação é cada vez
mais complexa e cara, de modo que a família pode, no máximo, arcar
com a casa, ficando tudo o mais para ser provido coletivamente, pelo
poder público.
Por
conseguinte, é compreensível que a população recenseada de 6.329
assentamentos irregulares, ou subnormais, distribuídos em 323
municípios, que constituíram uma amostra observada durante duas
décadas foi de 11,4 milhões de pessoas, em 2011, contra um número
de habitantes de 4,4 milhões, em 1991, nas mesmas localidades. Ou
seja, um
aumento de 160% em 20 anos.
Impressiona
a comparação da situação de escassez do crédito imobiliário (e
também do crédito geral) no Brasil com a observada em outros
países, segundo dados colhidos na pesquisa junto ao Banco Central
apresentada em (CNI-2012). O Quadro I seguinte ilustra essa questão,
com os dados expressos em valor das operações de crédito como
proporção do PIB.
QUADRO
I
SITUAÇÃO
DO CRÉDITO NO BRASIL E EM OUTROS PAÍSES
em
% do PIB - 2010
Países
|
Total
Crédito Privado/ PIB (em %)
|
Crédito
Imobiliário/ PIB (em %)
|
Outros
Créditos (%)
|
EUA
|
160
|
68
|
92
|
Inglaterra
|
110
|
75
|
35
|
Alemanha
|
105
|
45
|
60
|
França
|
87
|
28
|
59
|
Espanha
|
80
|
45
|
35
|
Chile
|
70
|
20
|
50
|
BRASIL(*)
|
35
|
2
|
33
|
Fonte:
Banco
Central
(*)
Segundo a ANEFAC-Assoc. Nac. dos Executivos de Finanças,
Administração e Contabilidade, o volume total de créditos do
sistema financeiro atingiu 55,2% do PIB e o do crédito imobiliário
7,8% do PIB, em agosto de 2013. Provavelmente, há divergências
metodológicas nos cálculo do BACEN para 2010 e da ANEFAC para 2013.
A
situação do Brasil é tão assimétrica em relação aos demais
países exibidos no Quadro I que chama a atenção, inclusive, a
comparação do Brasil com o Chile. O volume de crédito imobiliário
como proporção do PIB é 10 vezes maior no nosso vizinho do que o
número relativo ao Brasil e, seguramente, o sistema bancário
chileno não é mais sofisticado que o brasileiro.
A
explicação para essa posição modestissima do Brasil está
relacionada com o pequeno número de instrumentos de captação de
poupança para aplicação em habitação, que foi em parte superado
pela criação e regulamentação dos fundos de investimentos
imobiliários, e à política monetária praticada pelo Banco
Central.
Durante
anos, para ajudar a política fiscal e ao mesmo tempo melhorar a
rentabilidade dos bancos, públicos e privados, lhes foi permitido
aplicar suas reservas relativas aos depósitos de poupança
(cadernetas e letras imobiliárias) em títulos do Tesouro Nacional,
garantindo-lhes maior segurança e ganhos extraordinários com os
spreads
(taxas
de juros ativas de 12 a 20% a.a., dependendo do ano, contra taxa de
juros passiva de 6% a.a), muito superiores aos que seriam auferidos
em operações de crédito imobiliário. Por isso, durante mais de
uma década, não havia recursos para financiamento de construções
habitacionais. Tal situação (escandalosa) só foi revertida em
2008.
De
qualquer sorte, as estimativas do déficit habitacional, em termos de
necessidade de construção de novas moradias, e de moradias
inadequadas, ou seja, com condições internas e
externas
precárias, foram feitas em pesquisa do IBGE referida a 2008
(publicada em 2011), divulgadas pela Secretaria Nacional de
Habitação, do Ministério das Cidades, e citadas em (CNI-2012).
De
acordo com esta fonte, o déficit era de 5,5 milhões de habitações,
sendo 4,6 milhões em áreas urbanas (83,5%). De acordo com a SNH, o
déficit vem caindo em termos relativos e, mais recentemente, também
em números relativos, provavelmente devido ao Programa Minha Casa,
Minha Vida e à expansão do crédito imobiliário. A Política
Nacional de Habitação, do mesmo Ministério das Cidades, quando
formulada em 2004, considerava um déficit quantitativo, com base nos
dados da PNAD/IBGE de 1999, de 7,2 milhões de moradias, das quais
5,5 milhões em áreas urbanas.
Se
as metodologias das estimativas de 2004 e de 2008 forem coerentes,
pode-se comemorar uma diminuição do déficit quantitativo de
1,7milhões de moradias, em quatro anos, o que não é pouca coisa.
Não se consegue identificar, porém, qualquer afirmação que
garanta a comparabilidade dos números.
O
número de habitações inadequadas, também chamado de déficit
qualitativo, seguramente é superior ao déficit acima apresentado
(quantitativo), porquanto os domicílios inadequados ou subnormais
são, em geral, inacabados, faltando-lhes instalações elétricas e
hidráulicas, revestimento das paredes (reboco), etc. Além disso na
Política de Habitação de 2004, apoiada em PNAD, declara-se que as
áreas habitadas apesar da ausência de infraestrutura e de serviços
de saneamento ambiental abrangem 32% de todas as moradias do Pais, ou
10,2 milhões de domicílios urbanos duráveis com pelo menosuma
carência de água, esgoto, coleta de lixo ou eletricidade.
Deste
total impressionante, nada menos que 4,4 milhões de domicílios
carentes de infraestrutura estão situados no Nordeste (36,6%). Das
famílias que habitam aqueles 10,2 milhões de domicílios, nada
menos do que 60% têm renda inferior a 3 salários-mínimos.
Ou
seja, o panorama de uma década atrás refletia com fidelidade o
quadro de injustiças, que eufemisticamente se denomina
desequilíbrios sociais e regionais.
Finalmente,
cabe um comentário a propósito da expansão
desordenada das manchas urbanas das grandes cidades brasileiras, com
o surgimento de novas áreas urbanas desconexas do território já
ocupado, que são licenciadas para construção pelas Prefeituras, de
forma irregular, e passam a receber investimentos públicos para
implantação das infraestruturas (a primeira das quais é a do
sistema viário, para receber os transportes, e a última a de
esgotos sanitários). Tais investimentos valorizam muito os terrenos
daquelas áreas, legitimando assim a especulação imobiliária.
Fruto
do processo de financeirização dos terrenos urbanos, a expansão
desordenada das cidades, viabilizada pelo transporte automotor, causa
o encarecimento absurdo dos investimentos em novas infraestruturas, a
ociosidade das infraestruturas já existentes e o esvaziamento dos
centros e dos bairros tradicionais das cidades.
Infelizmente,
o desrespeito aos Planos Diretores e as posturas municipais com a
conivência dos Poderes Executivo e Legislativo ajuda a estragar, a
médio prazo, a qualidade de vida as cidades.
Saneamento
ambiental
Em
matéria de água e esgoto, o Instituto Trata Brasil sintetiza o
quadro nacional usando as informações do SNIS relativas a 2011, da
seguinte forma:
- O atendimento em água potável, quando consideradas as áreas urbanas e rurais do País, a distribuição de água atinge 82,7%da população.
- O atendimento em coleta de esgotos: chega a 48,3% da população brasileira, no sistema separador absoluto e no sistema unitário.
- Do esgoto coletado, apenas 38,7% recebe algum tipo de tratamento.
- Crescimento das ligações: entre 2011 e 2012, houve um crescimento de 1,9 milhão de ramais de água e 1,5 milhão na rede de esgotos de esgotos no País, crescimentos relevantes quando se trata de ampliação de sistemas complexos nas cidades brasileiras.
- O consumo de água por habitante no Brasil: foi de 167,5 litros por habitante ao dia, um pequeno incremento de 4,9% em 2012 com relação a 2011. A região com menor consumo é a Nordeste, com 131,2 litros por habitante por dia; já a região com maior consumo é a região Sudeste15, com 194,8 litros por habitante por dia.
- Perdas de água16: a média de perdas de água na distribuição alcançaram 36,9%, redução de 1,9 pp em relação a 2011, quando o valor foi de 38,8%.
- Receitas totais geradas pelos serviços de água e esgotos: alcançaram os R$ 83,2 bilhões no ano de 2011.
- Investimentos: movimentação financeira de R$ 83,2 bilhões no ano de 2012, referente a investimentos que totalizaram R$ 9,7 bi, mais receitas operacionais de R$ 39,2 bi e despesas de R$ 34,3 bi.
- Postos de trabalho: em 2012 o setor de saneamento gerou 726,6 mil empregos diretos e indiretos e de efeito renda em todo o país. Desses, 209,8 mil nas atividades diretas de prestação dos serviços e 516,8 mil gerados pelos investimentos.
A
Pesquisa Nacional de Saneamento Básico-2008, efetuada pelo IBGE,
acessível no URL seguinte,
<http://www.ibge.gov.br/home/estatistica/populacao/condicaodevida/pnsb2008/PNSB_2008.pdf>
permite
avaliar a situação da coleta, tratamento
e disposição final do lixo no País, bem como de manejo de águas
pluviais, com uma defasagem de pelo menos 5 anos.
“No
Brasil, o gerenciamento dos resíduos sólidos produzidos em suas
cidades, segundo a Pesquisa Nacional de Saneamento Básico - PNSB
2008, 61,2% dos serviços de manejo dos resíduos sólidos eram de
responsabilidade de entidades vinculadas à administração direta do
poder público; 34,5%, empresas privadas sob o regime de concessão
pública ou terceirização; e 4,3%, entidades organizadas sob a
forma de autarquias, empresas públicas, sociedades de economia mista
e consórcios. Os serviços de manejo dos resíduos sólidos
compreendem a coleta, a limpeza pública bem como a destinação final
desses resíduos, e exercem um forte impacto no orçamento das
administrações municipais, podendo atingir 20,0% dos gastos da
municipalidade.” (IBGE-PNSB-2008)
A
comparação de resultados da pesquisa de 2008 com os de pesquisas de
anos anteriores permite avaliar que houve considerável progresso em
matéria de disposição final dos resíduos sólidos, na década
analisada, conforme ilustra o Quadro II seguinte.
QUADRO
II
Destino
final dos resíduos sólidos, por tipos de destino
Brasil
- 1989/2008
Anos
|
Vazadouro
a céu aberto
|
Aterro
controlado
|
Aterro
sanitário
|
1989
|
88,2
|
9,6
|
1,1
|
2008
|
50,8
|
22,5
|
27,7
|
Fonte:
IBGE/PNSB
2008
De
acordo com a pesquisa do IBGE, “Com respeito ao quadro nacional,
como foi comentado anteriormente em relação à distribuição
regional da pobreza e dos investimentos públicos, as Regiões
Nordeste e Norte registraram as maiores proporções de destinação
desses resíduos aos lixões – 89,3% e 85,5%, respectivamente –
enquanto os localizados nas Regiões Sul e Sudeste apresentaram, no
outro extremo, as menores proporções – 15,8% e 18,7%,
respectivamente. Na Região Norte, destacaram-se, nesse sentido, os
municípios do Estado do Pará, onde a destinação dos resíduos aos
lixões foi praticada em 94,4% deles. Na Região Nordeste, os
destaques negativos couberam aos municípios dos Estados do Piauí,
Maranhão e Alagoas: 97,8%, 96,3% e 96,1%, respectivamente.
Na
Região Sul, os municípios de seus três estados – Santa Catarina,
Rio
Grande
do Sul e Paraná – registraram as menores proporções de
destinação dos resíduos sólidos aos lixões: 2,7%,16,5% e 24,6%,
respectivamente. O destaque coube aos municípios do Estado de Santa
Catarina, com 87,2% desses resíduos destinados a aterros sanitários
e controlados, figurando os municípios dos Estados do Paraná e Rio
Grande do Sul com 81,7% e 79,2%, respectivamente.
Na
Região Sudeste, os municípios do Estado de São Paulo registraram
as menores proporções de destinação dos resíduos sólidos aos
lixões, 7,6%, enquanto os municípios do Estado do Rio de Janeiro
foram o destaque negativo, sendo este tipo de destinação praticado
por 33,0% deles,” (IBGE-PNSB 2008).
Como
em alguns Estados (como o do Rio de Janeiro, por exemplo) e em muitas
cidades houve um esforço denodado para pôr termo à operação de
lixões e para a ampliação da coleta, estima-se que o quadro
nacional, nos últimos cinco anos, melhorou em relação ao
referencial de 2008.
O
Mapa IV seguinte ilustra esta situação do destino final dos
resíduos sólidos no plano nacional, referido a 2008.
No
que tange à situação da coleta e manejo das águas pluviais, a
PNSB-2008 oferece um quadro minucioso sobre as redes municipais de
drenagem urbana, riscos de assoreamento em função de erosão, vias
pavimentadas com drenagem etc. que não será reproduzida aqui por
razões de economia de espaço e porque o quadro é bastante
defasado.
MAPA
IV
DESTINAÇÃO
FINAL DOS RESÍDUOS SÓLIDOS
DOMICILIARES
E/OU PÚBLICOS - BRASIL – 2008
Telecomunicações/Conectividade
às Redes
O
Brasil está se tornando um dos maiores mercados do mundo de
telefonia celular e de crescente expressão em termos de conexões à
Internet, conforme os dados da ANATEL e do IBGE-Pesquisa Nacional por
Amostra de Domicílios, sintetizados por uma consultora privada17,
conforme apresentado nos Quadros III-1, 2 e 3 seguintes.
QUADRO III-1
NÚMERO DE ASSINATES E DE CONEXÕES
Fontes:
ANATEL
e IBGE/PNAD. Elaboração TELECO, disponível em
http://www.teleco.com.br/estatis.asp,
acesso em 20/05/14
QUADRO
III-2
DENSIDADES
POR 100 HABITANTES
QUADRO
III-3
DENSIDADE
POR DOMÍCÍLIOS
Destas
estatísticas depreende-se que: enquanto a planta de telefonia
celular do País se expandiu à acelerada taxa média de 11,7% a.a.,
entre 2009/2013, a planta de telefonia fixa permaneceu praticamente
estagnada, acompanhando apenas o crescimento demográfico. A
explicação para tal fenômeno está no preço da assinatura dos
serviços de telefonia fixa, que, juntamente com a tarifa cobrada nas
chamadas efetuadas e os elevados impostos incidentes, torna a conta
mensal muito alta, suportável apenas pelas classes média alta e de
alta renda, além das empresas e outras pessoas jurídicas.
As
concessionárias não divulgam entre os usuários a existência do
plano denominado “Acesso
Individual Classe Especial (Aice)”,
conhecido também como Telefone Popular, assinatura cujo custo varia
entre R$ 13,00 e 15,00/mês, incluídos os impostos. Certamente os
consumidores de mais baixa renda, se devidamente informados,
prefeririam adquirir este tipo de serviço à hipótese de arcar com
altos custos da telefonia celular pré-pago, cujo custo é de R$
1,65/minuto18.
Suspeita-se
que o quase silencio em relação ao AICE se deve ao fato que não é
do interesse das concessionárias que os consumidores migrem de um
tipo de serviço muito rentável (celular pré-pago), para outro que
é beneficiado por subsídio cruzado.
No
Brasil existem cerca de 118 milhões de computadores19,
através dos quais de 96 a 105 milhões ─ conforme a fonte da
estimativa ─ de brasileiros acessaram a Internet pelo menos uma vez
por semana, em casa, no trabalho ou numa das 90.000 lan
houses
espalhadas pelo País. Do número total de domicílios existentes,
nada menos do que 46% possuem computador e 40% têm acesso à
Internet.
O
número de usuários e a infraestrutura de comunicação em banda
larga tendem a explodir em todo o País nos próximos 10-20 anos, na
medida em que se implantem os programas federais (PNBL─ até aqui
muito lento ─ de ampliação do acesso à banda larga para as
periferias pobres das grandes cidades e para cidades médias e
pequenas, bem como de distribuição de computadores portáteis e
simplificados (UCA) para cada professor e aluno da rede pública de
ensino. A doação de um laptop
para cada aluno e cada professor está associada à expectativa de
que sendo os mesmos levados para casa, e socializado seu uso com a
família e os vizinhos, difundir-se-á rapidamente o processo de
inclusão digital da população (processo viral).
O
maior uso da internet hoje é para o correio eletrônico, mas muita
gente já a utiliza para fins de pesquisa, comércio eletrônico,
trabalho a distância, entretenimento ─ inclusive para assistir
programas de rádio e TV ─ e comunicação em redes sociais.
Enfim,
a chamada convergência tecnológica de diferentes plataformas (TV,
telefone celular e computador), que há poucos anos apenas se
prenunciava, já é uma realidade. Mas ainda há um longo caminho a
percorrer em termos de aperfeiçoamento das mídias, da multiplicação
dos serviços oferecidos, de produção de conteúdos digitais em
Língua Portuguesa e de democratização do acesso à banda larga,
ainda restrito a poucos. Os maiores problemas, no entanto, são que
os serviços são de qualidade sofrível e muito caros, em parte
porque a concorrência entre os provedores de conexão é pequena e
também porque os impostos incidentes são muito elevados.
O
número de conexões à banda larga, como expressão do uso de meios
de comunicação mais avançados (computador, tabuletas e
smartphones),
baseados na internet, experimentou um crescimento ainda mais
extraordinário no período sob análise, com taxa anual de 16,9%.
Isso equivale a dobrar tal número a cada cinco anos.
No
entanto, as densidades por 100 habitantes das conexões à banda
larga e assinaturas de TV paga ainda são relativamente modestos, no
Brasil, quando comparadas às de telefones fixos e, provavelmente,
vão crescer muito em 2014 e 2016, em função dos megaeventos
esportivos.
Quanto
à posse de aparelhos de rádio, TV e telefones, nos domicílios, o
Brasil está próximo da saturação e de limitação do mercado
apenas à reposição. Porém, quanto aos microcomputadores,
tabuletas, etc., com acesso à internet, ainda existe considerável
oportunidade para expansão do mercado, dependendo, principalmente,
da queda do preço dos mesmos, dos serviços de conexão e do aumento
de renda da população.
O
exame da oferta dos serviços de telecomunicações mais populares, a
telefonia celular, sob o ângulo regional reafirma os gritantes
desequilíbrios sociais e econômicos existentes entre os indicadores
dos Estados das rregiões Norte e Nordeste quando comparados aos das
do Sul, Sudeste e Centro Oeste, conforme ilustra o Quadro IV
seguinte.
QUADRO
IV
NÚMERO
E DENSIDADE/HAB. DE ANTENAS (ESTAÇÕES RÁDIO BASE)
DE
TELEFONIA CELULAR - POR ESTADOS E POR REGIÕES
Estados
da Federação
|
ERBs
Instaladas - 2013
|
População
2010
|
Antena/100.000
hab.
|
AC
|
189
|
732793
|
25,79
|
AM
|
1008
|
3480937
|
28,96
|
AP
|
179
|
668689
|
26,77
|
PA
|
1597
|
7587087
|
21,05
|
RO
|
406
|
1560501
|
26,02
|
RR
|
118
|
451227
|
26,15
|
TO
|
432
|
1385453
|
31,18
|
REGIÃO NORTE
|
3929
|
15866687
|
24,76
|
AL
|
840
|
3120922
|
26,92
|
BA
|
2907
|
14021432
|
20,73
|
CE
|
1938
|
8448055
|
22,94
|
MA
|
1011
|
6569683
|
15,39
|
PB
|
937
|
3766834
|
24,88
|
PE
|
2390
|
8796032
|
27,17
|
PI
|
750
|
3119015
|
24,05
|
RN
|
908
|
3168133
|
28,66
|
SE
|
522
|
2068031
|
25,24
|
REGIÃO NORDESTE
|
12203
|
53078137
|
22,99
|
ES
|
1343
|
3512672
|
38,23
|
MG
|
6996
|
19595309
|
35,70
|
RJ
|
7254
|
15993583
|
45,36
|
SP
|
17352
|
41252160
|
42,06
|
REGIÃO
SUDESTE
|
32945
|
80353724
|
41,00
|
PR
|
3800
|
10439601
|
36,40
|
RS
|
4672
|
10695532
|
43,68
|
SC
|
2459
|
6249682
|
39,35
|
REGIÃO
SUL
|
10931
|
27384815
|
39,92
|
GO
|
2160
|
6004045
|
35,98
|
MS
|
875
|
2449341
|
35,72
|
MT
|
1092
|
3033991
|
35,99
|
DF
|
1541
|
2562963
|
60,13
|
CENTRO
OESTE
|
5668
|
14050340
|
40,34
|
TOTAL
BRASIL
|
65676
|
190733703
|
34,43
|
Fonte:
Telebrasil
– Associação Brasileira de Telecomunicaçõs, disponível em
http://www.telebrasil.org.br/panorama-do-setor/mapa-de-erbs-antenas,
acesso em 20/05/14
A
média nacional é resultado da ponderação dos valores relativos ás
Regiões Norte e Nordeste, inferiores a 25 antenas para cada 100.000
habitantes, com os valores médios das Regiões Sudeste, Sul e
Centro-Oeste, próximos de 40 antenas para cada 100.000 habitantes. O
Distrito Federal sobressai-se pelo alto índice de instalação de
antenas (60/100.000 hab) e com isso eleva a média da Região
Centro-Oeste. Os demais Estados do CO tem índices bem próximos à
média nacional.
Evidentemente,
estes indicadores regionais diferenciam as Unidades da Federação em
termos de competitividade, tendo em vista que a disponibilidade dos
serviços de telecomunicações é um requisito fundamental para a
localização de determinadas atividades empresariais.
Como
dito anteriormente, não se esgotou a revolução em curso nos
hábitos de vida e nos métodos de trabalho, de laser, de estudo etc.
provocada pelas telecomunicações, que continuam intenso processo de
“destruição criativa” produzida pelas inovações tecnológicas.
A conectividade precisas ser democratizada para que as pessoas
localizadas fora das áreas ricas dos grandes centros também possam
ser beneficiadas por esses avanços.
A
crescente conectividade também está impactando fortemente o mundo
do trabalho, levando à criação de novas relações sociais de
produção. O teletrabalho, o aperfeiçoamento dos serviços de
intermediação de mão de obra, a capacitação profissional, a
criação acelerada de novas profissões ou ocupações, etc.,
baseadas na conectividade, somam-se àquelas transformações
provocadas pelas TICs nos processos de trabalho: automação e
robotização generalizadas, miniaturização, gestão de clientes
(CRM), gestão da produção à distância, ERP etc. são fenômenos
que estão se generalizando e mudando profundamente o mundo do
trabalho. As fábricas, o comércio e muitos,
serviços serão bem distintos dos atuais em 2030.
A
maior conectividade de todos os brasileiros, independente de sua
localização ou classe social, facilitará o acesso do País à
chamada Sociedade do Conhecimento, onde se prevê patamares mais
elevados de justiça social, de compartilhamento do patrimônio
cultural e maiores oportunidades profissionais e de realização
pessoal.
Vários
países já lançaram políticas públicas voltadas para viabilizar o
aumento da conectividade de seus cidadãos e empresas porque suas
sociedades e governos entenderam que este é um requisito
indispensável para que mantenham/ampliem sua competitividade e o bem
estar de seus cidadãos. Japão20
e Coréia já têm redes em banda larga a 100 Mbps21
atendendo a 90% de suas populações. Estão investindo para elevar a
conexão de todos os lares a 1 GBPS. A China, EUA, Grã Bretanha,
Uruguai e Austrália adotaram diferentes políticas públicas com o
mesmo objetivo. O programa australiano para interligar seus 30
milhões de habitantes em banda larga ultraveloz representa um
investimento de 43 bilhões de dólares australianos.
O
governo brasileiro também já atentou para o potencial transformador
da maior conectividade dos cidadãos e, por isso, desenvolve
programas de aumento da inclusão digital,
associando-os à inclusão social, bem como de facilitação do
acesso à banda larga em todos os rincões do País e para todas as
classes sociais. Na verdade, porém, está-se tratando de uma banda
larga restrita, de 3 Mbps nominais (na verdade a velocidade é menor,
inclusive nas grandes cidades), mas que deve ser precursora de uma
rede a 100 Mbps no futuroa médio prazo.
Como
dito anteriormente,
o governo brasileiro tem metas ousadas para a informatização e
conexão à internet de todas as crianças e jovens, dos 7 aos 18
anos (cerca de 40 milhões de pessoas), e os professores brasileiros
(2,6 milhões)
nos
próximos anos, na expectativa de que os mesmos, difundam o uso
inteligente do computador/telefone celular/aparelho de TVD por seus
familiares.
Além
dos canais oficiais de instrução e treinamento para a
informatização de professores e alunos, seria recomendável
utilizar a extensa rede de lan
houses
─ 90 mil estabelecimentos instalados em todo o País sem qualquer
apoio oficial ─ nesse processo de inclusão digital em massa da
população.
Por
outro lado, um programa de dimensões expressivas dos próximos
governos para o acesso à banda larga de 100 Mbps em todas as
cidades, para a informatização e conexão em massa da população
brasileira, abre a oportunidade para a afirmação de uma indústria
eletroeletrônica nacional forte,
competitiva no mercado mundial, capaz de produzir não apenas os
computadores e modens necessários, mas também os equipamentos e
softwares que compõem à infraestrutura física de comunicação em
banda larga, (rede de infovias em fibra ótica,
com
seus backhauls
nas cidades, conexões a redes wi-fi
e wi-max).
Transportes
urbanos/Mobilidade nas Cidades
Na
Região Metropolitana do Rio de Janeiro, de um total de 15 milhões
de viagens realizadas diariamente por seus 13 milhões de habitantes,
em 2014, nada menos do que 3
milhões (ou 20%) dos deslocamentos são realizados a pé,
por falta de renda. Na Região Metropolitana de São Paulo este
número salta para 29%!22
Uma
estimativa grosseira para o conjunto das 15 aglomerações
metropolitanas brasileiras, que congregam mais de 70 milhões de
habitantes, é de que os pobres realizam diariamente
cerca
de 30% do total de suas viagens
a pé. Se for mantida a tendência de aumento de renda dessa faixa da
população, espera-se que seus deslocamentos passem a ser feitos
pelo sistema de transportes públicos.
Os
estratos da população urbana que já utilizam os transportes
públicos tendem a aumentar o número de viagens per capita que
realizam, não só pelo efeito-renda, mas também pelo “efeito
rede”, ou seja, pela maior necessidade de presença física em
outros locais gerada pelo crescente uso das comunicações digitais.
O
acréscimo de demanda por viagens motorizadas urbanas, apesar do
crescimento da frota de automóveis, será canalizado principalmente
para o sistema de transportes públicos, com
destaque para o modal ônibus (aí incluído o BRT),
por ser este mais insinuante nas malhas urbanas e porque têm sido
sistematicamente insuficientes os investimentos nos modais sobre
trilhos (trens urbanos e metrôs).
As
estatísticas sobre a frota brasileira de veículo são conflitantes.
De acordo com o SINDIPEÇAS, sindicato das empresas fabricantes de
autopeças, “o
volume de automóveis, comerciais leves, ônibus e caminhões
circulantes ultrapassou 40 milhões de unidades em 2013”. De toda a
frota nacional, 31,5 milhões são automóveis; 6,3 milhões
comerciais leves, 1,7 milhão caminhões e 386,3 mil ônibus”.
O Sindipeças aponta, ainda, que circulam no Brasil 13 milhões de
motocicletas e 659 mil tratores”23.
Entretanto,
informações divulgadas pelo O Globo, em 30/11/2013, referentes a
setembro do mesmo ano, fornecem números bem maiores, porém sem
especificar a fonte dos dados, conforme apresentado no Infográfico
seguinte.
GRÁFICO
Não
se consegue colher do sítio eletrônico do DENATRAN uma informação
precisa sobre qual o estoque total de veículos automotores e como
este estoque se distribui pelos diferentes tipos de viaturas.
O
Brasil é considerado o terceiro maior mercado mundial para ônibus,
depois da China e da Índia. É também o maior fabricante de chassis
e carrocerias de ônibus do mundo ocidental, sendo inclusive grande
exportador, não só para a América Latina, mas também para a
Europa, a África e outras regiões.
Calcula-se
que somente os ônibus urbanos despejem no ar das cidades nada menos
do que 180.000 t/ano de monóxido de carbono (CO), 964.000 t/ano de
dióxido de carbono (CO2),
130.000 t/ano de óxidos de nitrogênio (NOx),
4.320 t/ano de óxidos de enxofre (SOx),
30.000 t/ano de hidrocarbonetos não queimados e 8.000 t/ano de
material particulado. Ou seja, mais de 1 milhão de t/ano de gases do
efeito estufa (GEE)
Uma
excelente solução para o transporte sobre pneus nas cidades seria o
emprego de canaleta segregada (BRT) para ônibus movidos a célula
combustível a hidrogênio, sendo este produzido por eletrólise da
água usando energia elétrica mais barata, isto é, consumida em
horários fora do pico de carga. A produção do ônibus propelido
por célula combustível a hidrogênio ainda depende da
nacionalização de certos componentes. Mas, vale ressaltar, empresas
brasileiras fabricantes de chassis e de carrocerias já desenvolveram
os projetos e fabricaram os protótipos de ônibus a hidrogênio já
em circulação em São Paulo e, experimentalmente, no Rio de
Janeiro.
Por
outro lado, a aquisição do carro próprio continua a ser uma
aspiração prioritária e essencial da grande maioria das famílias,
porquanto o que o automóvel representa conforto, liberdade e status.
A partir de 2009 o sonho do automóvel
tornou-se
mais facilmente realizável graças ao aumento da produção de
carros populares e das facilidades de financiamento para sua
aquisição, em mais de 60 meses.
O
DENATRAN informa que foram emplacados cerca 4,5 milhões de veículos
em 2013, mas seu sítio nãoé amigável e não se consegue abrir a
especificação por tipos. O fato é que frota nacional se expandiu
rapidamente nos últimos 10 anos, fazendo com que o trânsito nas
principais cidades brasileiras tenha se tornado pésssimo. Um terço
da frota nacional é matriculada no estado de São Paulo. Mais da
metade (55%) é matriculada em algum Estado do Sudeste. O Nordeste
abriga 12% do total,
A
participação da frota brasileira no total da frota mundial, que era
de 3% no final do século passado, aumentou e tende a crescer mais
ainda. Se considerado o fato de que, em 2009, havia 1 automóvel de
passeio para cada 5 a 6 habitantes, no Brasil, e que nos EUA — para
ilustrar este ponto com um exemplo extremo — este indicador
equivalia a 1,3 habitantes/auto, parece evidente que nosso mercado de
automóveis ainda está longe da saturação.
Projeções
da SAE24
para 2022, baseadas em hipóteses conservadoras, indicam que o Brasil
terá cerca de 100 milhões de veículos,
ou seja, um
acréscimo de 40 milhões de unidades (entre automóveis, ônibus,
caminhões, utilitários, motocicletas, motonetas etc.). O número de
automóveis deverá ser próximo de 60 milhões (mais 26 milhões de
unidades), o que corresponderá a um indicador de 3,8
habitantes/auto, aindarazoável.
A
indústria automotiva brasileira, capitaneada por montadoras
estrangeiras (17 multinacionais e uma nacional, que fabrica tratores,
caminhões, micro-ônibus, motos, motores e chassis), tem capacidade
de produzir anualmente veículos suficientes para abastecer o mercado
interno, bem como para a exportação, conforme as estratégias de
comercialização estabelecidas pelas matrizes das montadoras em
escala planetária.
Não
obstante a atual situação privilegiada do parque fabril automotivo
instalado no Brasil em cotejo com os de outros países (5ª posição,
segundo a OICA-Organização international de Fabricantes de Veículos
Automotores), a eventual reestruturação da indústria
automobilística mundial pode surpreender, com o deslocamento da
produção nacional para plantas localizadas no Extremo Oriente ou no
Sudeste Asiático.
Por
outro lado, as empresas automotivas aqui instaladas estão retardando
mais do que seria desejável o lançamento no mercado brasileiro de
modelos híbridos (motor queimando combustível líquido e motor
elétrico alimentado por bateria recarregável por corrente produzida
pelo motor convencional) que já comercializam em outros mercados. O
mesmo é válido para os carros totalmente elétricos, que já são
produzidos por montadoras estadunidenses, coreanas, japonesas,
alemães, italianas, além
das chinesas que ainda não se estabeleceram aqui.
Os
automóveis e ônibus com motores convencionais, a gasolina, diesel,
ou biocombustíveis, estão baseados em ciência dos séculos XVIII e
XIX (a Termodinâmica) e apesar das inovações tecnológicas
sofisticadas que emprega, para aperfeiçoamento da segurança e
desempenho, não envolve segredos industriais inacessíveis a
empresas brasileiras. Por outro lado, os carros de motorização
elétrica despontam com grandes perspectivas porquanto superam os
veículos com motor a combustão em torque, ruído, necessidade de
manutenção e respectivo custo, bem como custo de abastecimento
inferior. Perdem, hoje, apenas em raio de autonomia e têm seu preço
elevado em função do alto custo das baterias especiais (de lítio),
que permitem um alcance bem maior (150-200 Km) e podem ser trocadas
em minutos. No entanto, os investimentos em P&D em curso para o
aperfeiçoamento das baterias devem
conduzir ao seu barateamento em breve prazo.
O
Estado brasileiro deveria
articular e viabilizar o surgimento de uma grande montadora
brasileira de capital nacional para produzir carros elétricos,
congregando empresas do setor automotivo (como a AGRALE e montadoras
nacionais de CKDs importados), de equipamentos elétricos (como a
WEG, MOURA e
outros), grupos econômicos de capital nacional que concentram
atividades na exportação de commodities
minerais e agrícolas com
alta exposição
aos riscos do mercado internacional, além de outros grupos que
diversificam seus negócios, tais como grandes empreiteiras, bancos,
holdings
familiares
etc.
Note-se
que do ponto de vista ambiental e da saúde dos habitantes das
cidades, os motores a combustão interna dos carros e ônibus poluem
o ar com gases de nitrogênio, enxofre, carbono, hidrocarbonetos não
queimados, material particulado etc., que, além de contribuir para o
efeito estufa, provocam elevados índices de doenças respiratórias.
O
carro elétrico e o ônibus hidrogênio-elétrico oferecem soluções
capazes de eliminar das cidades as emissões de poluentes sem
prejudicar a mobilidade das pessoas. No Brasil,
isto é particularmente marcante porque nossa geração de
eletricidade, em anos de pluviosidade normal, é predominantemente de
origem hidrelétrica (80%) e da queima de biomassa (5%), sendo
residual a geração termelétrica a combustível fóssil (11%) e de
outras fontes (4%).
O
motor flex oferece uma solução apenas parcial, com o etanol, na
medida em que o crescimento da cana no campo absorve GEE mais ou
menos na mesma proporção do que são gerados nas
cidades
pela queima do álcool, acrescido do que é produzido dos mesmos na
lavoura da cana e no transporte (tratores, caminhões etc.). Além
disso, a eficiência energética do motor elétrico para automóveis
é 350% superior ao do motor a gasolina. Se a geração de
eletricidade
para o carro elétrico fosse térmica a gás, ainda assim este
ficaria em vantagem,
porquanto as centrais termelétricas são 100% mais eficientes do que
os motores a explosão (gasolina).
Qualquer
que seja o tipo de automóvel, porém, a mobilidade através do modal
de transporte individual vai crescer e, com isso, agravar os
problemas das cidades. Note-se que as grandes cidades atuais somente
são possíveis graças ao automóvel. Sem ele, hipoteticamente,
poder-se-ia, no máximo, criar grandes concentrações humanas
lineares, estendendo-se dos dois lados dos trilhos de ferrovias. Todo
o dinamismo da vida na cidade moderna seria impossível sem o
automóvel.
Ao
viabilizar a mobilidade a distâncias mais longas, o transporte por
ônibus e automóveis permitiu a produção em massa de moradias sem
que houvesse uma explosão dos preços dos terrenos urbanos,
favorecendo assim a presença maciça dos trabalhadores em torno dos
centros de produção. Ou seja, o automóvel ajudou a estabilizar os
custos trabalhistas e a renda fundiária urbana. Sem falar na
diversidade de formas de lazer, comércio, convívio social e
cultural disponíveis a minutos de distância da moradia e que tornam
a vida urbana mais atraente do que a rural para a maioria das
pessoas.
Apesar
de sua contribuição fundamental para o crescimento das cidades, os
veículos automotores trouxeram sérios problemas para os moradores
das cidades. Como responsáveis pelos congestionamentos, a violência
no trânsito, a poluição e as novas formas de sociabilidade, menos
comunitárias do que antes, os automóveis são acusados de vilões
em todas as cidades do mundo, mas a enorme maioria de seus habitantes
não está disposta a abrir mão dele em favor do transporte
coletivo.
Atualmente
estruturados irracionalmente, os transportes públicos pesam no
orçamento das famílias. Aos gastos com transportes devem ser
acrescidos os custos sociais dos congestionamentos — estimados em
1.000.000 de horas de trabalho perdidas/ano no percurso
casa-trabalho-casa e cerca de R$ 1 bilhão/ano de combustíveis
queimados por veículos parados no trânsito — e da poluição. Os
usuários dos transportes públicos que viajam nas horas de rush
nas grandes cidades despendem em média 3 horas por dia na condução,
o que equivale a passar de 2 a 3 dias por mês dentro de um ônibus
ou outra condução, com perdas evidentes de tempo que poderiam ser
dedicadas ao descanso, lazer, convívio familiar, estudo etc. O
número de atendimentos aos clientes da rede do SUS afetados por
doenças respiratórias é de 1,3
milhão/ano,
boa parte dos quais provocados pela inalação das substâncias
poluidoras lançadas ao ar pelos veículos automotores nas cidades.
3.Conclusões
As
elites brasileiras gostariam de transformar o Brasil numa potência
de classe mundial. Mas não reconhecem de forma explícita que isso
só ocorrerá quando as enormes desigualdades sociais e regionais
forem, em muito, atenuadas.
A
outra condição para alcançar aquele objetivo é a de haver
considerável investimento na infraestrutura das cidades, tanto para
sua expansão física quanto para aperfeiçoar as instituições que
cuidam de sua gestão. Atender prioritariamente às cidades é
atender a 85 a 90% da população.
A
arrecadação de impostos do País deverá alcançar/superar a marca
dos R$ 2 trilhões em 2014, ou seja, US$ 800 bilhões em um ano. Isso
é muito dinheiro para qualquer país do mundo, exceto os EUA cuja
receita tributária total deverá ser US$ 5,7 trilhões em 2014
(apenas sete vezes mais).
A
arrecadação brasileira seria cerca de 10% maior se não houvesse
renúncia fiscal da ordem de US$ 100 bilhões por ano25,
ou seja entre 4 e 5% do PIB. Este valor seria a ordem de grandeza do
investimento anual necessário, num horizonte de 20 anos, para
melhorar a infraestrutura das cidades e assim aumentar a qualidade de
vida de 85% da população brasileira.
No
entanto, o gasto público tem priorizado outras funções de governo
que não aquelas de interesse para o desenvolvimento urbano: moradias
bem construídas e formalmente reconhecidas, em áreas urbanas
dotadas de infraestruturas de saneamento (água, esgoto, lixo),
drenagem pluvial e pavimentação, sistemas de transportes coletivos
e de massa na grandes cidades, iluminação pública, redes de
telecomunicações em banda larga.
Os
transportes públicos entraram na agenda dos governos municipais,
estaduais e federal (BNDES), em quase todas as capitais escolhidas
como sede de jogos da Copa do Mundo, como consequência das críticas
da FIFA e, posteriormente, do Comitê Olímpico Internacional. As
jornadas de protesto da população em 2013 serviram para dar
visibilidade a um problema sério de má qualidade de serviços
públicos que já existia há anos.
A
agenda dos governos no que diz respeito aos transportes de
passageiros, no entanto, é pobre e desatenta em relação à
responsabilidade constitucional do Estado em matéria de mobilidade e
ao seu dever social de priorizar os modais de grande capacidade, em
detrimento do transporte sobre pneus (tanto o individual, que é o
que vem sendo incentivado no último qüinqüênio, quanto o
coletivo). Ademais, por ignorância ou falta de empenho, os governos
não se interessa em adotar inovações tecnológicas capazes de
reduzir alguns dos problemas gerados pelos sistemas de transportes
coletivos, tais como os ônibus elétricos a hidrogênio e a gás
natural, bem como os carros de motor elétrico.
O
PAC II resgatou a prioridade e previu investimentos em transportes
públicos de R$ 38 bilhões
no
período 2010 a 2014. Em breve se poderá fazer um balanço dos
investimentos em trens urbanos, em linhas de metrô (100 km) e na
modalidade BRT-Bus
Rapid Transit
(550 km), inventada em Curitiba, em 1974, mas só estendida a outras
cidades brasileiras após ser consagrada em cerca de 80 cidades do
mundo. Hoje em dia, 85% dos curitibanos usam sua RIT-Rede Integrada
de Transportes.
O
principal problema para a modernização dos sistemas de transportes
e reforma urbana das cidades brasileiras é, do ponto de vista
institucional, a falta de uma política pública com caráter de
política de Estado, e robusta do ponto de vista dos recursos, com
acesso mais fácil ao financiamento público para os estados e
municípios, tolhidos pelos limites de endividamento impostos pela
Lei de Responsabilidade Fiscal. Os instrumentos para a implementação
desta política estão previstos no Estatuto das Cidades (Lei no.
10.257/01).
Será
preciso observar o que acontecerá após 2014 (nas cidades-sedes da
Copa) e 2016 (no Rio de Janeiro), em matéria de prioridade para os
transportes públicos. Os investimentos em metrôs, trens urbanos e
BRTs continuarão a receber prioridade? A renúncia fiscal em favor
dos automóveis populares continuará a jogar contra os defensores do
transporte público de qualidade?
Uma
fonte de recursos especificamente prevista em lei para financiar
projetos de transporte público é a CIDE cobrada sobre combustíveis,
e cuja alíquota foi zerada para ajudar a manter o preço dos
combustíveis líquidos em nível artificialmente baixo e, assim,
represar a inflação.
A
mobilidade urbana também será favorecida se, além de melhor
planejamento e controle do uso do solo urbano em cada cidade
(competência municipal, conforme incisos V e VIII, art 30 da CF) —
revalorização dos centros das cidades, reocupação de imóveis
vazios, combate à especulação imobiliária com os instrumentos do
Estatuto da Cidade, até aqui pouco aplicados —, houver a criação
e consolidação de uma rede de cidades integradas que favoreça o
desenvolvimento policêntrico do país, com desconcentração da
população, melhor distribuição das atividades econômicas e
menores custos de infraestrutura. A iniciativa nesse campo cabe ao
Governo Federal (incisos IX e XX, art. 21 da CF)
Uma
preocupação estratégica nacional, indispensável e urgente, diz
respeito à alteração da trajetória de expansão das duas
megalópoles brasileiras, quase já conurbadas — situação única
no mundo —, e cujo funcionamento se torna cada dia mais caro em
termos de equacionamento das grandes funções/componentes
metropolitanas: trânsito (mobilidade), drenagem urbana (enchentes),
saneamento (abastecimento d’água, tratamento de esgotos,
disposição final do lixo), etc. O financiamento das soluções
destes problemas é e será compartilhado pelos contribuintes de todo
o país.
Os
congestionamentos urbanos são também reflexos da baixa qualidade
(ou verdadeira ausência) da gestão urbana, da forma como a cidade e
o trabalho se organizam. Os horários de funcionamento dos
escritórios, fábricas, colégios, repartições públicas etc. não
precisam ser os mesmos. Os horários de almoço, de entrada e de
saída dos funcionários públicos não precisam coincidir. Enfim, há
muitas soluções adotadas com sucesso em outras cidades do mundo que
podem ser adaptadas à realidade brasileira, e, para isso, a maior
conectividade e o uso mais intensivo das TICs pode contribuir
sobremaneira.
Mas,
especialmente, os engenheiros precisam lutar para que o Planejamento
volte a ser praticado com seriedade no Brasil.
Luiz Alfredo Salomão é engenheiro formado pela ENE/UFRJ, em
1968.
Foi deputado estadual (1983-87) e deputado federal (1987-2002) pelo
Rio de Janeiro.
Foi deputado à Assembléia Nacional Constituinte (1987-88)
Foi Secretário de Estado no Rio de Janeiro nas Pastas de Obras e
Meio Ambiente,
Indústria e Comércio, Ciência e Tecnologia e de Transportes
HABITAT-PNU
para os Assentamentos Humanos – Nota do blog ULTIMO SEGUNDO –
vide
http://ultimosegundo.ig.com.br/brasil/2012-08-21/relatorio-da-onu-mostra-que-desaceleracao-urbana-ja-ocorre-na-america-latina-e-no-caribe.html,
acesso em 15/05/2015.
NATAL,
Jorge Luiz Alves; UMA CONTRIBUIÇÃO À CRÍTICA DA FORMAÇÃO
BRASILEIRA –DESENVOLVIMENTO, ESPAÇO E INIQUIDADES SOCIAIS” –
Mimeo -parte de pesquisa da fundação Oswaldo Cruz.
SAE-Secretaria
de Assuntos Estratégicos da Presidência da República – POLÍTICA
NACIONAL DE FLORESTAS PLANTADAS – coord. Luiz Alfredo Salomão –
Brasília, 2011
CYMBALISTA,
Renato, A TRAJETÓRIA RECENTEDO PLANEJAMENTO TERRITORIAL NO
BRASIL:apostas e pontos a observar, Revista Paranaense de
Desenvolvimento, Curitiba abril 2007,
IBGE
– REGIÕES DE INFLUÊNCIA DAS CIDADES –2007, Rio de Janeiro.
IBGE-
PESQUISA NACIONAL DE SANEAMENTO BÁSICO -2008, Rio de Janeiro,
acessível em
http://www.ibge.gov.br/home/estatistica/populacao/condicaodevida/pnsb2008/PNSB_2008.pdf
CNI
– CIDADES: MOBILIDADE, HABITAÇÃO E ESCALA. UM CHAMADO À AÇÃO,
2012, Brasília
1
As sesmarias constituíam regime de doação
gratuita de terras a quem possuísse os meios para cultivá-las. Tal
regime podia fazer sentido no pequeno Portugal, mas era
inteiramente inapropriado para a imensa colônia, distante e que
tinha de importar braços. As sesmarias eram grandes latifúndios e
seus proprietários não possuíam os meios necessários para
torná-los produtivos. Mas souberam empregá-los muito bem como
reserva de valor e de poder político, para dominar os
trabalhadores, fossem eles escravos importados, fossem brasileiros
pores.
2
No
período 1950-70 a taxa de crescimento da população urbana superou
os 5% a.a., ou seja, as cidades dobravam o número de seus
habitantes a cada 13-14 anos.
3
Graças ao trabalho da EMBRAPA-Empresa Brasileira de Pesquisa
Agropecuária, criada por lei em 1972, órgão central do Sistema
Nacional de Pesquisa Agropecuária
4
De acordo com a FAO, o Brasil será nos próximos anos o maior
exportador de alimentos, superando os EUA.
5
Dos 851 milhões de ha do território
nacional, 320 milhões estão antropizados (38%). Ou seja, mais de
3/5 das terras do País (62%) estão preservadas e assim podem
permanecer. Da área total antrópica, 170 milhões de há (53% do
total antropizado) estão hoje ocupados por pecuária
predominantemente extensiva.
6
O conceito de redes de cidades será examinado mais adiante.
7
O PIN foi criado pelo Decreto-Lei Nº1106,
de 16 de julho de 1970,
durante a ditadura militar, no Governo Médici.
8
Criada pela Lei 3692, de 1959, teve Celso Furtado como inspirador e
primeiro secretário executivo, e extinta em 2001. Inspirou, em
1966, a criação da SUDAM e da SUDECO. A SUDENE foi recriada pelo
Governo Lula, mas sem os mesmos poder político e instrumentos de
ação de sua antecessora.
10
Fato que impressionou muito o Presidente Lula, quando tomou
conhecimento desse tipo de política pública.
11
O Ministério do Planejamento e Gestão do Brasil publicou, no
âmbito do Projeto Eurobrasil 2000, texto de referência sobre
Planejamento Territorial Integrado, de autoria do prof. José Luiz
Luzón, especialista em planejamento territorial e desenvolvimento
regional da Universidade de Barcelona sobre a experiência espanhola
e sobre o Planejamento Territorial da Catalunha. Acessível em
http://www.planejamento.gov.br/secretarias/upload/Arquivos/seges/euro_brasil/publicacoes/081016_PUB_PPI.pdfis
12
Através de Medida Provisória convertida na Lei n. 10.683/2003
13
A propósito do tráfico de drogas é interessante a linha de
pesquisa desenvolvida no Departamento de Geografia da UFRJ, que
mapeou as rotas das drogas a partir da movimentação bancária de
compensação de cheques em várias cidades da Amazônia Ocidental e
do Estado de São Paulo.
14
Conceitos diferentes entre si e que têm suas especificidades para
fins de avaliação de políticas públicas.
15
No Estado do Rio de Janeiro, o consumo per capita supera os 230
litros/hab/dia, o que leva a crer que é grande o desperdício, o
que costuma ser explicado em função do baixo nível de
micromedição.
16
No Estado do Rio de Janeiro, o nível de perdas de água, técnicas
e comerciais, é bem superior a este, da ordem de 230 l/hab/dia.
17
Teleco-Inteligência em Telecomunicações
18
Referente ao Plano “Toda Hora”, pré-pago, da Claro,
considerado dos mais baratos.
19
A informação consta do blog da FECOMÈRCIO-RJ e foi levantada pelo
Instituto IPSOS
20
O Japão começou na década de 1990s a ligação em fibra ótica
de todos os domicílios do país, que já dá acesso à banda larga
em 100 Mbps a 90% de sua população.
21
Mbps, abreviatura de mega bits por segundo, ou milhão de bits por
segundo, é unidade de velocidade nas telecomunicações.
22
Carlos Zundt, in “Ônibus Brasileiro a
Hidrogênio-Tecnologias Renováveis para o Transporte Urbano no
Brasil”-EMTU/SP, PNUD, 2009, pag. 53
23
Notícia publicada no sítio:
http://carros.ig.com.br/noticias/frota+brasileira+chega+a+40+milhoes+de+veiculos/7482.html
24
Estudo elaborado por Gustavo Santos, considerando curvas de evolução
do número de habitantes por veículo para cada estado da Federação.
No estudo não se levou em conta possíveis efeitos da
redistribuição da renda sobre a demanda por automóveis das
classes de renda mais baixa, bem como ignoraram a possibilidade de
redução dos preços dos modelos populares em função da redução
dos custos associada à maior escala de produção, etc.
25
De acordo com o Tribunal de Contas da União, a renúncia fiscal do
Governo Federal foi de US$ 187 bilhões, em 2011, superior aos
gastos públicos efetuados nos programas de Saúde, Educação e
Assistência Social. Public. Folha de São Paulo, seção Poder,
edição eletrônica de 24/05/2014
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