16.1.12
Silvia Ribeiro
La Jornada
La Jornada
Uma reportagem de Jeremy Scahill publicado em The Nation
(Blackwater`s Black Ops, 15/09/2010) revelou que o maior exército
mercenário do mundo, Blackwater (agora denominado Xe Services) vendeu
serviços clandestinos de espionagem à multinacional Monsanto. A
Blackwater mudou de nome em 2009, depois de tornar-se famosa em todo o
mundo pelas denúncias sobre seus abusos no Iraque, incluindo os
massacres de civis. Continua sendo o maior contratante privado do
Departamento de Estado dos Estados Unidos em “serviços de segurança”,
ou seja, para praticar o terrorismo de estado dando ao governo a
possibilidade de negar sua autoria.
Muitos militares e ex-oficiais da CIA
trabalham para a Blackwater ou para alguma de suas empresas vinculadas,
que criou para desviar a atenção de sua má fama e gerar mais lucros
vendendo seus nefastos serviços – que vão desde informação e espionagem
até infiltração, conspirações políticas e treinamento paramilitar a
outros governos, bancos e empresas multinacionais. Segundo Scahill, os
negócios com multinacionais - como a Monsanto e a Chevron, e gigantes
financeiros como a Barclay`s e Deutsche Bank -, são canalizados através
de duas empresas que são de propriedade de Erik Prince, dono da
Blackwater:Total Intelligence Solutions e Terrorism Research Center.
Estas compartilham oficiais e diretores com a Blackwater.
Um deles, Cofer Black, conhecido por sua
brutalidade sendo um dos diretores da CIA, foi quem fez contato em 2008
com a Monsanto como diretor da Total Intelligence, negociando o contrato
com a companhia para espionar e infiltrar organizações de ativistas
pelos direitos dos animais e contra os transgênicos e outras atividades
sujas do gigante biotecnológico.
Contatado por Scahill, o executivo Kevin
Wilson, da Monsanto negou-se a falar, mas mais tarde confirmou a The
Nation que tinham contratado Total Intelligence em 2008 e 2009, segundo a
Monsanto somente para fazer o acompanhamento de “informações públicas”
de seus opositores. Além disso, disse que a Total Intelligence era uma
“entidade completamente separada da Blackwater”.
Contudo, Scahill conta com cópia dos
e-mails de Cofer Black posteriores à reunião com Wilson, da Monsanto,
onde explica a outros ex-agentes da CIA, usando seus endereços
eletrônicos na Blackwater, que a discussão com Wilson foi no sentido de
que a Total Intelligence se transformaria no "braço de inteligência” da
Monsanto, espionando ativistas e outras ações, inclusive fazendo com que
”nossa gente se integre legalmente a esses grupos”. A Monsanto pagou
para a Total Intelligence 127 mil dólares em 2008 e 105 mil dólares em
2009.
Não é de assombrar que uma empresa de
“ciências da morte” como a Monsanto, que desde suas origens tem se
dedicado a produzir materiais tóxicos e a espalhar venenos, desde o
Agente Laranja até os PCB (Policlorobifenilos), agrotóxicos, hormônios e
sementes transgênicas se associe a outra empresa de bandidos.
Quase ao mesmo tempo em que era publicado
esse artigo em The Nation, a Via Campesina denunciou a compra de 500
mil ações da Monsanto, por mais de 23 milhões de dólares, pela Fundação
Bill e Melinda Gates, que com isso terminou de tirar sua máscara de
“filantrópica”. É outra associação que não surpreende.
Trata-se de um casamento entre os dois
monopólios mais brutais da história do industrialismo: Bill Gates
controla mais de 90% do mercado de programas patenteados de computação, e
a Monsanto perto de 90% do mercado mundial de sementes transgênicas e a
maioria do mercado global de sementes comerciais. Não existem em
nenhuma outra área industrial monopólios tão vastos, cuja própria
existência é uma negação do cacarejado princípio “competição do mercado”
do capitalismo. Tanto Gates como a Monsanto são muito agressivos na
defesa de seus mal afamados monopólios.
Ainda que Bill Gates tente dizer que a
Fundação não está ligada à suas atividades comerciais, tudo o que essa
faz demonstra o contrário: grande parte de suas doações termina
favorecendo os investimentos comerciais do magnata, além do que ele, na
realidade, não doa nada: mas sim, em vez de pagar impostos às arcas
públicas, investe seus lucros onde estes o favoreçam economicamente,
inclusive em propaganda de suas supostas boas intenções. Ao contrário,
seus projetos financiam projetos tão destrutivos como a geoengenharia ou
a substituição das medicinas naturais e comunitárias por medicamentos
patenteados de alta tecnologia nas áreas mais pobres do planeta. Que
coincidência, o ex-secretário de saúde do México, Julio Frenk e Ernesto
Zedillo (ex-presidente mexicano) são conselheiros da Fundação.
Da mesma forma que a Monsanto, Gates se
dedica também a tratar de destruir a agricultura campesina em todo o
planeta, principalmente através da chamada “Aliança para uma Revolução
Verde na África (AGRA). Esta funciona como cavalo de Tróia para despojar
os agricultores africanos pobres de suas sementes tradicionais,
substituindo-as primeiro pelas sementes das empresas e finalmente pelas
transgênicas. Para isso a Fundação contratou, em 2006, justamente Robert
Horsch, um diretor da Monsanto. Agora, Gates, farejando novos lucros,
foi diretamente à fonte.
Blackwater, Monsanto e Gates são três
caras da mesma figura: a máquina de guerra contra o planeta e a maioria
das pessoas que o habitam, sejam campesinos, indígenas, comunidades
locais, gente que quer compartilhar informação e conhecimentos ou
qualquer outra coisa, que não queira estar na lógica do lucro e
destruição do capitalismo.
Silvia Ribeiro é investigadora do Grupo ETC.
Tradução do espanhol: Renzo Bassanetti
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